quinta-feira, 4 de abril de 2013

Direito Civil IV (04/04/2013)



Da Formação dos Contratos (Art. 427 - 435)

1. “Momentos” da Vida do Contrato: Assim como nem todas gestações são exitosas com a vida de um bebê, a vida dos contratos pode ter um período mais conturbado no seu nascimento. A doutrina, em cima do art. 422 afirma que no direito brasileiro podemos dividir em 4 momentos da história do contrato. A vida do contrato não é apenas da assinatura a execução.
1.1. Fase 1 – Pré-Contratual/Negocial: Uma fase que antecede a formação do contrato, o reconhecimento jurídico da existência deste contrato, quando as partes fazem as negociações (Culpa in Contrahendo – Ihering). Estamos falando do processo que no RS a jurisprudência usa o termo “a obrigação como um processo”, é um processo que começa desde antes da assinatura do contrato e pode ter muitas interferências. Quando as pessoas iniciam negociações, elas não estão obrigadas a firmar contrato, não é porque entramos numa loja que temos algum tipo de obrigação de fechar contrato, essa é a regra geral, a liberdade plena na fase de negociação. Mas a partir do art. 422 surgiram alguns acórdãos que objetivaram proteger as partes já na fase de negociações estipulando o seguinte: de regra, quem negocia não é obrigado a fechar contrato, contudo quando do teor destas negociações observa-se a legítima confiança despertada no par, eventualmente algum dano verificado na fase pré-contratual poderá ser dirimida, por exemplo, nos dirigimos a um apartamento que está em oferta de locação, chegamos lá, nos interessamos pelo imóvel e nas negociações pedimos para a locadora que até a segunda-feira tenhamos preferência, e a locadora diz que não tem problema, que aguarda até segunda pela resposta, se não dermos resposta, ela vai interpretar como negativo o interesse, na segunda ligamos para a locadora e descobrimos que o apartamento foi locado no sábado, haveria algum tipo de pretensão em relação a nós? Se pensarmos que na parte das negociações as pessoas são absolutamente livres, a resposta tradicional é que aqui não há obrigação nenhuma, porque não teve contrato formado, e a lei só vai proteger os contraentes até o evento de formação do contrato. Este caso foi um dos primeiros pela “Teoria da Responsabilidade Pré-contratual” (ou da “Culpa in Contrahendo”), que é aplicada, em tese, somente quando conseguir se provar que na fase de negociações (pré-contratual) houve nítida violação ao Princípio da Boa Fé. São raros os casos do nosso TJ, mas eles vêm crescendo. Regra Geral: As partes são livres começarem e terminarem a negociação, há exceções, mas a prova incumbe a suposta vítima, se o juiz não se convencer, não tem como fazer nada! Ex.¹: digo que se uma pessoa fizer propaganda do imóvel que quero vender, vou dar 5% do preço do imóvel para esta pessoa quando eu receber o valor total do imóvel, mas a pessoa sugere que eu lhe dê a medida que o comprador for pagando, então decidimos que vamos discutir na outra semana, mas no sábado esta pessoa me liga e diz que tem um comprador e vendo para esta pessoa, vou ter que indenizar a pessoa? Minha defesa em juízo será que estávamos negociando, não chegamos ao acordo no pagamento do preço, mas a pessoa dirá que eu não agi conforme a boa=-fé, porque estávamos negociando a forma de pagamento dos 5%, mas os 5% já estavam pré-acertados entre nós, ou seja, provavelmente eu serei condenada. Ex.²: um corretor foi contratado de emergência para na ausência de outro estar presente no lançamento de um edifício, como uma empresa que tinha acertado com 5 corretores para estar no dia do lançamento, 1 deles não pode ir, mas no dia um deles diz que um amigo pode ir, então ele vai, e não houve tempo hábil para se estipular exatamente as cláusulas da relação que ele tem com a construtora e com a imobiliária, há essas urgências e o mercado precisa ser atendido! Pode ter violação ao art. 422 do CC e responsabilidade pré-contratual.
1.2. Fase 2 -  Formação (no sentido de existência jurídico de um contrato): Há um contrato, o que é necessário para que haja?
1.3. Fase 3 – Execução/Adimplemento: A relação negocial é finalizada. Aqui acaba a tutela jurídica do contrato. Feito um contrato, as partes se preocupam com a execução do contrato (será estudado hoje).
1.4. Fase 4 – Responsabilidade Pós-Contratual: Busca de indenização, fase rescendente. Uma vez finalizado o contrato, surge uma fase de responsabilidade pós-contratual, um exemplo é o recall. Outro exemplo é o da construtora que ergue um prédio a frente do Tejo e depois de alguns anos ergue outro entre o prédio e o Tejo, tirando a vista dos primeiros!

2. Força Obrigatória da Proposta (Vinculatividade, 427):
Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.
-> Nestas situações (art. 427) a doutrina fala que não há vinculatividade desde o início.
-> Regra geral: A proposta obriga, tem vinculatividade, é obrigatória! Ninguém é obrigado a oferecer, mas no momento que ofereceu tem que se responsabilizar por cumprir a promessa! Quem entrar num processo judicial buscando o cumprimento de uma proposta, a tendência é a vitória, porque esta é a regra geral. Ex.: num super está dizendo “Apenas hoje: Kg da picanha 9,90”, “Cerveja Litro 1,99”, “Coca-Cola 2L 0,99”, pegamos a publicidade que saiu dentro do jornal, nos dirigimos até o super e queremos fazer as compras, como a publicidade é uma forma de proposta, ela também obriga, então se chegamos no super com esta publicidade e o super diz que houve um erro, a cerveja não é 1,99 e sim 6,99. A doutrina diz que salvo se o erro foi crasso, o fornecedor tem que dar o produto pelo preço mostrado na publicidade. A exceção está em, por exemplo, quando sai numa publicidade que um carro é 2.400 reais, e na verdade é 24.000 reais, seria demais oferecer tutela para o consumidor, porque uma publicidade com esse erro crasso, não tem a intenção de enganar ninguém! O consumidor tem o ônus de provar para o juiz que as pessoas acreditariam nesse erro!
2.1. Exceções Legais (citadas no art. 427):
- Termos da Proposta: Anúncio do super no jornal “Só essa semana: garrafa de guaraná a 1,99”, mas diz embaixo: “estoque disponível são 5.000 garrafas”, ou “limitado aos primeiros 500 consumidores”. Salvo se for uma situação que fique evidenciada que o objetivo da loja não era vender por 1,99 apenas, mas sim atrair uma multidão para dentro do supermercado e receber dinheiro desta multidão, como ter de estoque apenas 10 garrafas, venderia tudo para o primeiro que chegasse, os demais iam até lá, teria acabado e acabariam fazendo outras compras, seria uma estratégia de marketing. O juiz diria que ele deveria ter oferecido um estoque maior, ou para mais consumidores. Mas salvo estas hipóteses de estoque muito pequeno, que dá para ver que o objetivo não é desovar o estoque, e sim trazer pessoas que não iam conseguir comprar este produto e acabariam comprando outros, salvo estas hipóteses seria válida esta exceção, porque estou anunciando que os 500 primeiros terão direito a participar da minha proposta, se você quiser se arriscar e vir ao meu estabelecimento, você que sabe!
* Quando há restrição de direitos devem ser redigidas com destaque, o juiz terá que ver se o consumidor conseguiria ler aquelas letras pequenas, e se ficar constatado que não dava, será como se não tivesse sido escrito, desde que dê para acreditar o que está escrito no resto da publicidade. Imagens meramente ilustrativas vale como exceção legal? Depende, o juiz vai estar atento a quão próximo o produto é da imagem ilustrativa, porque nunca será igual, mas também não pode ser tão diferente, tem que haver alguma correspondência.
- Natureza da Proposta: Normalmente nas rádios escuta-se propostas de que se responder corretamente a questão irá ganhar um par de ingressos, etc. Ou seja, é da cultura de algumas promoções que o futuro aceitante, a pessoa que escuta a promessa já saiba o que ela pode contar com esta promessa, como “no dia 23 a rádio tal vai dar ingressos para tal show aos os ouvintes da rádio”, não posso no dia 23 ligar para a rádio e pedir meu ingresso, a rádio não vai dar, porque a natureza desta proposta é que a rádio faz uma ação de marketing e informa que no dia 23 alguns ouvintes ganharão ingressos, mas nenhum de nós pode acreditar que qualquer um que ligar vai ganhar, são os primeiros 10, ou os primeiros 30, é um número limitado, porque não é normal darem ingresso para todos ouvintes, o normal é alguns ouvintes ganharem e a maioria não ganhar!
- Circunstâncias do Caso: A doutrina comenta como uma manifestação do Princípio da Operatividade do Código Civil (o CC brasileiro foi alicerçado em 3 princípio: eticidade, socialidade e operatividade). O Princípio da Operatividade era porque Miguel Reale gostava de deixar a solução do caso concreto nas mãos do juiz, não do legislador. Por isso que é muito amplo os artigos, não é o legislador que define o problema, e sim é o juiz. Quando a doutrina fala que a proposta não é vinculativa dependendo das circunstancias do caso, deu um cheque na mão do juiz, para criar exceções: “Neste caso, excepcionalmente, por tal peculiaridade não deveria ser considerado obrigatória”, e fundamenta.
* Salvo nestas 3 exceções, a proposta vincula, ninguém foi obrigado a oferecer!

3. Perda de sua Vinculatividade (428):
Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta:
I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante;
II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente;
III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado;
IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente.
-> É vinculativa, mas deixa de ser.
3.1. Hipóteses Legais (I, II, III, IV e V):
- 1ª Hipótese: Pessoas presentes e na hora: se as pessoas estão presentes, isto é, uma olhando a outra, ou por telefone (analogia) ou pelo Skype, por exemplo, digo que vendo um livro por 30 reais para 3 pessoas presentes, mas uma delas mudo de assunto, elas tiveram a oportunidade de dizer que queriam comprar por aquele valor, elas perdem a oportunidade de dizer que aceitam compram por aquele valor, então posso oferecer para outa pessoa. Uma das críticas do CC, há uma equiparação entre os presentes, o CC fala “consideram-se presentes as pessoas que estão em telefone e outros meios” e a discussão da doutrina é que se quando usamos internet podemos considerar as pessoas presentes? Depende. Para efeito de compra e venda online, a jurisprudência gaúcha fala que se equipara a pessoas ausentes (uma não olhando a outra), porque 1º não consigo ver o produto e não sei se era exatamente o que queria, e 2º que se for uma compra e venda entre ausentes o consumidor tem 7 dias para desfazer o negócio e receber o dinheiro de volta. Estas são as duas razões pelas quais a jurisprudência entende que a compra e venda pela internet são entre ausentes. Está em aberto na jurisprudência e na doutrina o uso de alguma tecnologia pela internet que permitisse uma analogia por telefone. Há um acordão no RJ sobre o Skype, porque uma coisa é eu comprar de um site e não ver o produto, outra coisa é comprar pelo Skype, que a pessoa tem a oportunidade de tirar todas as suas dúvidas, há um funcionário do outro lado, então seria razoável interpretar como uma compra e venda por telefone.
- 2ª Hipótese: Fiz uma proposta sem prazo, não disse, por exemplo, posso dizer que estou vendendo a minha coleção de Pontes de Miranda e quem quiser me procura, ou posso dizer que estou vendendo minha coleção do Pontes de Miranda e quem quiser me procura no próximo mês, se eu falar para me procurar no próximo mês, durante o próximo mês eu tenho a obrigação de vender, agora se eu não falei que estou vendendo só no próximo mês, fica a dúvida por quanto tempo eu tenho que deixar minha coleção disponível para venda, ou se posso mudar de ideia. A lei fala de prazo razoável para que o destinatário tome conhecimento e responda. Isto é, falei hoje que estou deixando a venda minha coleção do Pontes de Miranda, as pessoas para que ofereci ficaram 15 dias pensando, e acabei vendendo 15 dias depois para outra pessoa, na minha visão eu já não estaria mais obrigado a negociar com as outras pessoas por prazo indeterminado, pois achava que 15 dias era um período razoável para me avisarem que queriam comprar. Este é o problema da proposta entre ausentes, no prazo da norma. A lei não diz qual o prazo razoável, então se permite concluir que ele vai ficar sabendo, que ele vai dizer que quer comprar e eu também vou ficar sabendo que ele quer comprar, vai depender de cada caso.
- 3ª Hipótese: Por exemplo, ofereço um prazo, mando um email e digo que quem quiser comprar 2 cadeiras até sexta feira, me informe pelo celular nº tal, já dei um prazo para ligarem para meu celular e dizerem que querem aceitar, depois de sexta, se não me ligarem, perdeu o prazo, se não fechou, deixou de ser vinculativo! Como promoção de Páscoa, Dia dos Namorados, Natal, a loja só tinha sentido naquele momento!
- 4ª Hipótese: A retratação do proponente: por exemplo, aparece no jornal de quinta, dizendo: “A rede de supermercados tal informa que na edição de ontem foi veiculada uma proposta equivocada, onde se afirmava que o valor do produto era 19 reais, mas na verdade é 199 reais, ele não está a venda por 19 reais”, com isso as empresas tentam fazer chegar ao conhecimento do mercado que ela não quer vender daquela forma anunciada, se é que um dia ela quis, agora ela não quer mais! Posso me arrepender como proponente sim, desde que eu faça chegar nas pessoas interessadas a informação antes de saber da aceitação delas.

4. Oferta ao Público (429):
Art. 429. A oferta ao público equivale a proposta quando encerra os requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das circunstâncias ou dos usos.
Parágrafo único. Pode revogar-se a oferta pela mesma via de sua divulgação, desde que ressalvada esta faculdade na oferta realizada.
-> Não sei quem receberá minha proposta. Se dou os dados essenciais, como, por exemplo, o cidadão vai num mercadinho e aparece uma folha dizendo que perdi um cachorro que atende por Toy, dou tantos reais para quem levá-lo a minha casa, não sei quem vai ver a folha, quem vai achar o cachorro e quem vai devolver. O mesmo vale numa oferta de rádio, não sei quem está ouvindo a oferta, mas alguém no público vai dizer que eu que vou ter direito a recompensa, o público vai se manifestar, esta é a ideia.

5. A Aceitação (430 – 433): 4 normas no Código Civil. Até agora estávamos tratando do proponente, e agora vamos analisar o ângulo do aceitante. Regras da Aceitação: Se é uma proposta entre presentes, a aceitação teria que ter sido feita na hora. Os maiores problema estão na aceitação entre ausentes.
Art. 430. Se a aceitação, por circunstância imprevista, chegar tarde ao conhecimento do proponente, este comunicá-lo-á imediatamente ao aceitante, sob pena de responder por perdas e danos.
-> Norma antiga no direito. Ou seja, fiz uma proposta que deveria ter sido respondida até sexta feira, um cidadão de Santa Cruz do Sul, na quarta feira remeteu uma carta por Sedex 10, imaginando que chegaria até as 10 horas de quinta, a carta foi extraviada, e recebo a carta na quarta-feira da semana seguinte. Isso é do tempo que as comunicações não estavam tão instantâneas. A ideia seria que eu não estava obrigado a receber esta aceitação, mas que eu deveria informar a outa parte que houve o seguinte problema, estou informando pelo Princípio da Boa-Fé, o negócio não foi feito, vá celebrar contratos com outras pessoas, porque aqui não haverá contrato, porque houve um erro do Sedex 10 e a carta chegou alguns dias de atraso.
Art. 431. A aceitação fora do prazo, com adições, restrições, ou modificações, importará nova proposta.
-> Isso é comum da negociação. Ex.¹: alguém comparece num apartamento decorado e pergunta qual o preço, é 500 mil reais e as condições são X, ela gostou, mas queria que fosse 480 mil, isso é uma nova proposta da pessoa, não é uma aceitação, porque ela não está concordando com a proposta que recebeu, o que ela fez se chama contraproposta, uma outra proposta, a pessoa trocou de papel, antes era a aceitante e agora é a proponente, “faço o negócio nestas condições”. Ex.²: venceu o prazo da proposta, ninguém se interessou, não existe mais, não tem força vinculativa. Posso contatar o proponente e oferecer de novo o negócio, ou seja, quer resgatar a força vinculativa desta proposta? Se positivo, me informe, pois o negócio vai ser fechado mesmo após o negócio.
Art. 432. Se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa.
-> Exemplos do mercado. Ex.¹: o funcionário tira uma caixa de uvas e põe no mercado, há um acordo verbal entre o mercado e o fornecedor que haverá um acerto do que foi vendido, deve ser isso. Então, o artigo diz que nem sempre essa aceitação deve ser cabal, estou aceitando a caixa, porque há ramos do mercado econômico que é comum não haver a aceitação expressa, se resolve pela via tácita, não preciso cada vez dizer que aceito a caixa de frutas. Ex.²: estou dentro do avião, chega o lanche, a mulher pode perguntar se aceito, ou pode simplesmente colocar em cima da minha mesinha. Se uma empresa me oferece uma coisa sem eu pedir, de regra, é uma amostra grátis, como mandar um produto para minha casa sem eu pedir. Mas as pessoas na sinaleira que lavam o vidro do meu carro sem eu pedir, nem sabem o que é o CDC, muito menos sabem que estariam me oferecendo uma amostra grátis.
Art. 433. Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante.
-> Considera-se que não haverá aceitação se antes dela ser formalizada o próprio proponente tomar conhecimento da retratação do aceitante (“não quero mais”). Ex.: eu aceitante mandei uma carta para o proponente dizendo “desconsidera o teor”. Em cima desta norma a doutrina discute qual das seguintes teorias teria sido a adotada pelo CC. Por trás desta resposta está a seguinte questão: Quando o contrato é formado (quando há proposta e aceitação), é necessário que o proponente tenha conhecimento da aceitação? Ou, por exemplo, basta que o aceitante espessa a sua aceitação por uma carta hoje e hoje já está fechado o contrato? A doutrina se divide: Aqueles que defendem que o contrato é fechado quando o proponente toma ciência da aceitação alheia, é a Teoria da Cognição. É majoritário a teoria da Agnição, que bastaria a carta ser expedida, porque é obvio que se faço uma negociação entre ausentes, e sou o vendedor, eu teria que aguardar um prazo razoável (que não sei qual é) para ter conhecimento da aceitação. Hoje, com a tendência das relações instantâneas, a Teoria da Cognição vai, no futuro, ser a dominante no Brasil, mas ainda não é, mas são exemplos mais históricos que estão por cima desta questão!
* Nos ausentes
5.1. Teoria da Cognição: Eu tenho ciência (uma cognição) de que o aceitante quer fechar negócio comigo.
5.2. Teoria da Agnição: Bastaria a carta ser expedida.

6. Retratação do Aceitante (433): Acima.

7. Aceitação entre Ausentes (434):
Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto:
I - no caso do artigo antecedente;
II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta;
III - se ela não chegar no prazo convencionado.
-> Em cima do art. 434, a doutrina majoritária entende que foi adotada a Teoria da Agnição. Para nosso código, embora seja de 2002, o projeto dele é da década de 70, e nesta década não tínhamos Sedex, email, internet, etc, não tínhamos esta facilidade de comunicação que temos hoje. Ex.: na época do Código Francês de 1804, as cartas de Paris para Strasbourg, demoravam mais ou menos 1 ou 2 meses, porque a velocidade média das carroças era em torno de 4 a 8 km por dia, e hoje este trajeto se dá em umas 2 horas de trem, ou pela internet na mesma hora! Mudou muito! E este Código de 1804 ainda é vigente na França. Esta é a vantagem  das regras do Miguel Reale, ele não quis afirmar conceitos, e quis deixar na mão do juiz a solução. Princípios do Melhor Interesse da Criança, Princípio da Boa Fé Objetiva e Princípio da Função Social são princípios que não ficam velhos nunca, o Código pode viger por mais tempo, segundo Miguel Reale, ele não queria contextualizar tanto naquele momento histórico, pois em 50 anos seria um código velho, ele quis dar opções mais abertas, para que a doutrina, promotores e juízes atualizem.
* Nos Ausentes

terça-feira, 2 de abril de 2013

Direito Penal IV (02/04/2013)



Tipo Subjetivo de Homicídio:
-> O homicídio é o único crime contra a vida que é punido na forma dolosa e culposa, os outros só são punidos na forma dolosa. Assim, a adequação da conduta ao art. 121, caput, §§ 1° ou 2°, ou ao art. 121, § 3°/art. 302 da Lei n° 9.503/97, pressupõe a verificação, no caso concreto, dos pressupostos dogmáticos do dolo ou da culpa.

Revisão da Parte Geral:

-> No crime doloso o agente quer o resultado. E o crime culposo é o crime não desejado (sem querer), por isso que se fala no caso em que o agente não deseja o resultado.

Dolo:
- Direto: É a forma mais dura do dolo! O agente quer o resultado, como meio (dolo direto de 2° grau = dolo de consequências necessárias) ou como fim (dolo direto de 1° grau). A diferença é que no dolo direto de 1 grau o resultado é a própria finalidade do agente e no dolo direto de 2º grau o resultado seria meio para a finalidade diversa. Ex.¹: Numa briga de bar saco uma arma e atiro contra alguém porque não gosto da cara dele, seria um dolo direto de 1º grau, a morte dele é por mim desejada. Ex.²: Quando mato um vigia de banco para roubar o banco, a morte dele também é por mim desejada, mas é um meio para a finalidade diversa, ou seja, eu mato alguém com o fim de fazer algo além disso. Como a morte no latrocínio que seria um exemplo de dolo direto de 2º grau. Ex.³: Desejo matar alguém que está num voo tal, instalo uma bomba no avião, em relação a pessoa que desejo matar eu teria um dolo direto de 1º grau, e em relação a todos os demais passageiros (porque não dá para matar só quem eu quero) o resultado é também desejado, mas como meio, então temos o dolo direto de 2º grau. A importância disso é nenhuma, não faz diferença!
- Eventual: O agente prevê o resultado (previsão subjetiva) objetivamente previsível (previsão objetiva) e aceita a sua verificação.
Culpa:
- Consciente: O agente prevê o resultado (previsão subjetiva) objetivamente previsível (previsão objetiva), mas não aceita a sua verificação.
- Inconsciente: É a forma mais dura da culpa! O agente não prevê (imprevisão subjetiva) a possibilidade de causar um resultado previsível (previsão objetiva).

* O problema do crime culposo é que tenho que fundamentar de que maneira a posso punir alguém que causa o resultado sem deseja-lo? Em que devo me basear? Muitas vezes no plano moral buscamos uma absolvição quando causamos algo sem querer, como quando esbarro com uma pessoa no corredor e digo “desculpa, foi sem querer” e a pessoa quando vê que não fiz por gosto e me desculpa. O “sem querer” no cotidiano muitas vezes é não é culpável, não gera uma responsabilidade no plano moral, o que acontece é que para o direito penal às vezes o “sem querer” não absolve e o grande problema é saber em que se basear para punir alguém e qual o parâmetro para isso. Uma morte não desejada sempre será crime? Há um limite entre o “sem querer” punível e o não punível. Ex.: No horário de pico, um motorista vinha trafegando no seu veículo a 80 km/h e uma criatura despenca da passarela na frente dele, ele atropela e mata essa pessoa, ele não desejou esse resultado, foi sem querer, haveria responsabilidade penal numa situação dessas? Seria um absurdo condenar esse motorista por uma morte de alguém que despencou de uma passarela, mas e qual a diferença desse caso para o caso de um motorista que vai trocar o CD no carro perde a direção e atropela um pedestre? Os dois motoristas causam a morte de uma pessoa sem querer! Porque no 1º caso é fácil perceber que ele não vou ser punido e no 2º é fácil perceber ele vai ser punido? O crime culposo é problemático, porque quando causo um resultado desejado fica fácil justificar uma sentença condenatória, mas quando falo de um resultado que não é desejável, vou ter eu me basear em algum parâmetro que não seja a pretensão do agente. A discussão de dolo e culpa vem do Direito Romano, mas mais focalizado no Direito Civil. O problema do crime culposo é que precisamos de um critério que nos dê um parâmetro, e esse critério foi diagnosticado como sendo a previsibilidade.

Previsibilidade:
- Objetiva (Social): Um padrão de conduta. Leva em consideração um padrão social de conduta, não estou olhando para o causador do resultado.
- Subjetiva (Individual): Previsibilidade pessoal do causador do resultado. Ele fez ou não fez a previsão do resultado. Ele, percebendo sua conduta, poderia ou não ter previsto o resultado.

Previsibilidade Objetiva: Qual padrão social de conduta seria esse? O direito penal trabalha com o critério do Homem Médio (nem a pessoa mais diligente do mundo, nem a menos diligente do mundo). Ex.¹: Sujeito estava dirigindo seu carro, foi trocar o CD do rádio e perdeu o controle do carro, o homem de diligência mediana teria perdido o controle do carro ou não? Não estou olhando para o motorista, e sim estou verificando se a conduta dele, de acordo com o padrão social de conduta gera a frustação de uma expectativa, a expectativa de todos nós é que o motorista que vai trocar o CD do rádio não pode perder o controle do carro, mas no exemplo narrado o motorista acabou perdendo o controle, então independente do que está passando na cabeça dele, já posso antecipar que existe uma previsibilidade objetiva de causar o resultado, porque de acordo com o padrão social de conduta, um homem com diligência mediana teria previsto que mudando o CD do rádio do veículo não se pode perder o controle no meio, e se ele tem alguma dificuldade, seria melhor que ele tivesse parado o carro. Este mesmo padrão social de conduta tem problemas:
Esse padrão social de conduta às vezes é construído por um dado real, o homem médio não existe, ou seja, esta diligência mediana que se quer construir como padrão social de conduta não é um padrão social de conduta, porque a maioria das pessoas desrespeita as regras de trânsito. Numa estrada que tem limite de velocidade de 80 km/h, quase ninguém anda nesta velocidade, não que isso seja certo, mas é assim, esse padrão de conduta pode variar de região para região, até em gênero. O seguro de carro para a mulher é mais barato porque a mulher é mais cuidadosa que o homem no trânsito, normalmente o homem comete mais acidentes no trânsito que a mulher. A mulher média é mais prudente que o homem médio, mas o padrão de conduta é o mesmo para todo mundo, homem e mulher. O homem médio é bonzinho, e ele que vai dizer se há previsão objetiva ou não, o crime culposo pressupõe no mínimo previsibilidade objetiva, pode até não ter a subjetiva. Ex.¹: O motorista que perde o controle do carro quando está mudando o CD, talvez no caso concreto não esteja passando pela cabeça dele que ele vai perder o controle do carro, mas o que se espera de uma pessoa minimamente diligente é que ele preste atenção! Neste exemplo não há previsão subjetiva, mas há previsão objetiva, o padrão social de conduta foi frustrado. Mas no exemplo da passarela não há nem previsão objetiva nem subjetiva, porque o padrão social de conduta não é que alguém imagine que uma pessoa vá cair do céu na frente do meu carro, o motorista não tem que prever isso, o homem médio não teria previsto, então quando não há nem previsão subjetiva nem objetiva se chama de “infelicitas facti” (fato infeliz), infelicidades acontecem, e não haverá crime nestes casos! Ex.²: Uma mulher dirigia na região da serra durante a noite numa velocidade normal e uma pessoa que caminhava no acostamento se atirou na frente o carro e ela conseguiu desviar e não atropelou a pessoa, então ela dirigiu um pouco mais até o posto da Polícia Federal de Lajeado, parou o carro e avisou que tem uma pessoa que se jogou na minha frente no carro dele e seria melhor dar uma olhada, o policial pegou o telefone dela e no dia seguinte uma pessoa liga para a mulher, diz que tem informações que ela estava conduzindo o carro dela na estrada perto Lajeado, ela confirmou que estava sim, ai esta pessoa pergunta se ela se lembra que alguém se atirou na frente do veículo dela, ela diz que sim, então a pessoa diz que ela é a pessoa que veio 10 minutos depois dela, o cara que estava no acostamento se jogou na frente do carro de novo, mas dessa vez a pessoa o matou, o depoimento da mulher que quase atropelou vai ser fundamental, porque de acordo com as regras de trânsito, quando a gente enxerga uma pessoa caminhando no acostamento, tenho que confiar que ela não vai se jogar na frente do meu carro, é imprevisível que alguém se atire na frente do meu carro, mas claro que tudo depende do local, se estou numa rua muito movimentada, tenho que desconfiar que alguém de uma hora para outra vai atravessar a rua, mas numa estrada em que o fluxo é 80 km/h, o padrão social de conduta diz que pedestre é pedestre, não vai através, e motorista é motorista e não vai avançar no acostamento. O que acabou acontecendo é que foi um “infelicitas facti”. É como pegar motoboy no trânsito, é absolvição na certa, porque eles infringem tanto as regras de trânsito que hoje há uma presunção, como a presunção de que “quem bate atrás é o culpado”, mas isso não pode se presumido sempre, tem que ver o caso concreto.
* “Infelicitas facti”: verifica-se nos casos em que o resultado é causado sem que o agente o tenha previsto (imprevisão subjetiva) e sem que ele fosse previsível (imprevisão objetiva). O efeito disso é que o fato não constituirá crime, por ausência de tipicidade.

Culpa Inconsciente: O autor do resultado não teve consciência do resultado, é a forma mais pura do crime culposo, é o “sem querer”, quando esbarro alguém no corredor, não saio do elevador pensando “vou bater em alguém, vou bater em alguém”, mas o que espero é que meus colegas não saiam empurrando todo mundo no elevador. Ex.: acelerar além do limite, ninguém imagina o tempo todo que vai se acidentar, na maioria dos casos de acidente de trânsito não está passando pela cabeça dele que ele vai causar o resultado. Há previsão objetiva, mas não há previsão subjetiva.
Culpa Consciente e Dolo Eventual: Esse é o problema! O problema maior é que no dolo eventual há previsão objetiva e há previsão subjetiva, assim como na culpa consciente. O dolo eventual e a culpa consciente tem em comum a previsibilidade subjetiva, o agente antevê a possibilidade de causar o resultado. O agente prevê o resultado (previsão subjetiva) objetivamente previsível (previsão objetiva), mas não aceita a sua verificação. Normalmente o acidente de trânsito provocado por uma desatenção do motorista que está ao celular é um crime com culpa consciente, ele pode não ter previsto que com sua imprudência pudesse causar o resultado, mas o que espero é que as pessoas não falem ao celular. O que distingue um homicídio doloso de um homicídio culposo não é a previsibilidade, este é o grande problema, as pessoas anteverem o que estão envolvidas numa situação de risco não as faz agir em dolo eventual por si só. Ex.: Fui alertado pela Prefeitura que a marquise do meu restaurante pode cair, esse dado fático indica a previsão subjetiva de algo perigoso/arriscado, mas a circunstância de eu ter sido alertado pela Prefeitura que a marquise vai cair não denota por si só um dolo eventual, porque o dolo eventual e a culpa consciente não estão na previsão subjetiva, e sim está na aceitação do resultado, ou seja, no dolo eventual eu tenho a aceitabilidade/indiferença ao resultado e na culpa consciente tenho uma situação de não aceitabilidade do resultado. Por isso que a doutrina fala que há uma diferença entre o aspecto cognoscitivo (conhecer/previsão) e o volitivo (vontade/aceitabilidade), a diferença entre o dolo eventual e culpa consciente não está no aspecto cognoscitivo/conhecimento/previsibilidade, a diferença está no aspecto volitivo/vontade, ou seja, se o agente aceita ou não o resultado.
* Dolo Eventual é aquele que se depara com o resultado e diz “foda-se”, significa indiferença. Culpa Consciente é quando ele causa o resultado e lembra “fodeu”, significa que não queria, que não aceitava o resultado, mas ele acabou acontecendo. Não tem como saber o que a pessoa estava pensando na hora do fato, então vou tirar estes dados da circunstância do caso concreto, vou ter que analisar objetivamente o caso concreto para ver o que aquela pessoa estava pensando. Posso trabalhar com padrão social no âmbito da previsibilidade, mas a aceitabilidade ou não do resultado é individual. Ex.: Uma mãe, na hora que estava no trabalho lembrou que esqueceu veneno de rato colorido em cima da mesa, ela tem um filho de 7 anos que sai de manhã para ir para a escola e volta apenas no fim da tarde, ela sai ao meio dia e lembra que esqueceu o veneno, se espera que uma prudente tendo filho pequeno não deixe veneno em cima da mesa, mas a segunda reação dela é que a criança volta só no fim da tarde e ela vai estar de volta antes disso e dará tempo de recolher este veneno, por alguma circunstância o menino volta antes da escola, tinha a chave de casa, entrou em casa, viu o pozinho brilhante em cima da mesa, colocou no leite e tomou. Tenho ume exemplo narrando a previsão subjetiva, mas não há a aceitabilidade do resultado por esta mãe, ela achou que ia dar tempo, que ela voltaria e tiraria o veneno, mas claro que não tem como generalizar a solução para todos os casos, normalmente os casos que ocorrem dentro de caso com arma ao alcance de criança, o que se espera do pai prudente é que ele tranque a arma onde a criança não alcance, mas se o pai esquece de guardar a arma, o filho manuseia a arma e dá um disparo, é um exemplo de culpa inconsciente.
* A diferença entre dolo eventual e culpa consciente não é o aspecto cognitivo (previsão), mas sim o aspecto volitivo do dolo (aceitabilidade do resultado).

Polêmica envolvendo o Dolo Eventual no Trânsito:
-> O dolo e a culpa residem na conduta, não no resultado causado. O dolo e a culpa integram o desvalor da ação, e não o desvalor do resultado, se um crime é doloso ou culposo, depende da conduta praticada, não do resultado causado. Ex.: Se atiro contra alguém com a intenção de matar, o dolo de matar é o mesmo se eu acertar ou errar o tiro, porque na minha conduta de matar eu desejava o resultado. Se o resultado é grave ou não, não desvirtua o dolo, não vou responder por um crime disparo de arma de fogo se for atirar em alguém e errar, porque se minha intenção é matar a pessoa será tentativa de homicídio, o dolo é o mesmo no crime consumado e no crime tentado. O dolo é o mesmo se acertei o tiro e só causei lesões corporais ou se acertei e matei a pessoa. O elemento subjetivo está na conduta! O que vivemos hoje é um deslocamento velado do dolo do desvalor da ação para o desvalor do resultado. Hoje se o crime é culposo ou doloso passa a depender mais do resultado que causo do que propriamente da minha conduta. Ex.¹: Caso da embriaguez no trânsito, se eu estiver totalmente embriagado e quase atropelar alguém, vou responder por embriaguez no trânsito, mas se eu embriagado atropelar alguém, vou responder por homicídio doloso. Mas se o dolo está na conduta e a conduta é a mesma, qual a diferença? Num ele atropelou alguém e no outro não! Se eu imputar tentativa de homicídio para quem quase atropelou alguém no trânsito estando embriagado, vou ter que ver por quantas pessoas essa pessoa passou até chegar em casa e imputará tentativa e homicídio para todas estas pessoas, mas deslocou o desvalor da ação para o desvalor do resultado! Na prática, quando um motorista bêbado atropela uma pessoa e quebrou o braço de uma pessoa, o crime é lesão corporal culposa, se ele matar, será homicídio doloso. Deslocou-se o dolo do desvalor da ação para o desvalor do resultado, ou seja, o fator sorte e azar passa a ser determinante para o crime culposo e doloso. Ex.²: O sinal amarelo significa atenção, é para diminuir a velocidade, mas a maioria das pessoas dá uma aceleradinha e passa, mas a pessoa pensa que vai dar tempo e não vai acontecer nada, a pessoa não vai pensar que vai causar um acidente, mas se naquele momento nós quase atropelarmos alguém, não tem problema, mas se naquele momento alguém atropelar uma pessoa e matar, vai ser homicídio doloso, porque daí o resultado vai ser grave, vai ser algo repugnante e será dolo! Houve uma vulgarização do dolo, o dolo virou resultado, se o fato é grave, é dolo! Houve uma vulgarização conceito, as pessoas querem cada vez mais pena, punição, e ai o problema é que a pena do homicídio culposo é de 1 a 3 anos, fica baixa para certos fatos, daí desvirtua tudo! É o que está acontecendo no caso de Santa Maria, participação culposa em crime doloso, não existe isso, ou seja, separdo, coloco dolo para alguns e coloco culpa para quem me interessa! Colocaram dolo porque o caso foi grave, a moral é mandar para júri! Não tenho como num crime doloso quebrar a participação culposa de alguém, separar quem praticou a conduta menos grave é culpa e quem praticou a conduta mais próxima do resultado é dolo! Aquilo é um caso evidente de homicídio culposo, mesmo a licença estando vencida, porque a maioria dos prédios a licença está vencida, não é só por causa disso que vai me transformar em dolo eventual.

Estudos de Casos:

14) “A”, em 27/11/2009, encaminhou seu automóvel para revisão numa determinada concessionária de Porto Alegre, sendo que o mecânico-chefe alertou-o para o fato de o veículo estar apresentando um vazamento no líquido de freio, recomendando-o a trocar todo o sistema. Tendo em vista que a correção do problema custaria muito caro, bem como o fato de o mecânico ter mencionado que, provavelmente, o vazamento não iria prejudicar o uso do automóvel nos dois meses subsequentes, “A” decide postergar a troca da peça para o mês seguinte. Em 11/12/2009, no instante em que “A” dirigia-se a Canoas pela BR-116, veio a perder o controle do veículo em razão de problemas no freio (cuja origem relacionava-se ao vazamento antes mencionado), colidindo violentamente no veículo de “B”. O acidente acabou causando a morte de “B”. Diante disso, dê o enquadramento jurídico-penal da conduta de “A”, justificando eventual tipicidade objetiva e subjetiva resultantes do fato.
-> Previsão subjetiva, o mecânico disse que tinha problema no freio, até aqui já tenho a explicação que isso não é uma culpa inconsciente. O mecânico disse que está com problema no freio, mas pode rodar mais um pouco, ou seja, esta frase diz que é uma não aceitabilidade do resultado. Mas o motorista acaba matando uma pessoa por problemas no freio! É um crime de trânsito com culpa inconsciente, a previsão subjetiva está no alerta do problema no freio e a não aceitabilidade do resultado está onde o mecânico disse que o vazamento não iria prejudicar. Mas se nesse caso o motorista matasse 24 pessoas que estavam no ônibus e estampar na capa de um jornal, mudaria tudo, isto é uma covardia!

15) “A”, querendo vingar-se do patrão que o despedira, decide colocar uma bomba em sua loja, programando o artefato para explodir ao final do expediente, quando poucas pessoas ali estivessem. Infortunadamente, sua esposa, acompanhada do filho de 6 anos de idade, decide procurar o empregador para tentar sensibilizá-lo, e os três acabam morrendo na explosão. Dê o enquadramento jurídico-penal do fato.
-> Quando coloco uma bomba num local para explodir, tenho dolo de matar alguém, não interessa quem seja, se ajo com dolo de matar o patrão, ajo o dolo de matar quem seja, ainda que seja a esposa e o filho! Então isto é um concurso formal de homicídio doloso por dolo direto. Se uso o resultado doloso, as mortes que ocorrem no meio não podem ser culposas! Explodir a bomba onde está o patrão, pode haver uma situação limite entre o dolo direto em 2º grau e o dolo eventual. A diferença entre o dolo direto em 2º grau e o dolo eventual é que no dolo direto de 2º grau a pessoa deseja o resultado. No caso do avião é tranquilo pensar que aceito a morte de todas as pessoas que estarão no avião, mesmo que queria matar apenas uma pessoa. Mas quando desejo matar uma pessoa que está numa faixa de segurança, coloco o carro em cima da pessoa, a morte de quem eu desejo é dolo direto de 1º grau, a morte das demais pessoas é dolo direto de 1º grau. Não posso colocar uma bomba num local e querer matar apenas uma pessoa, vou aceitar matar todas as pessoas que estavam ali! Não tem como classificar como homicídio culposo a morte das outras pessoas, pode haver a discussão se a morte dos demais é dolo direto de 2º grau ou dolo eventual, o que interessa é que o resultado é no mínimo aceitável.

16) “A”, durante reformas internas em sua loja no centro de Porto Alegre, vem a ser informado pelo arquiteto que a marquise do estabelecimento está comprometida, havendo risco de desabar a qualquer momento. Num primeiro instante, “A” desconfia que o arquiteto lhe havia dito aquilo simplesmente para receber mais honorários. Contudo, chama um engenheiro para averiguar a situação, sendo que este confirma a situação precária da laje, assim como o risco iminente de desabamento. Apesar de novamente alertado, e indiferente à possibilidade de maiores danos, “A” não determina a realização dos reparos. Dias após, a marquise vem a cair sobre pedestres que trafegavam pelo local, causando a morte de “B” e a amputação da perna de “C”, que, além disso, grávida de 6 meses, veio a perder os dois filhos gêmeos. Dê o enquadramento jurídico-penal do fato, justificadamente.
-> Previsão subjetiva, alertaram que pode dar problema. O engenheiro disse que vai cair, mas “A” ficou indiferente ao resultado (azar!), então “A” não fará os reparos, e uns dias depois mata “B” e causa a amputação da perna de “C”. Em relação a “C” é tentativa de homicídio, e além disso estava grávida e os 2 filhos gêmeos morreram, no máximo seria uma conduta culposa, mas seria um aborto, que não é punido na forma culposa, é vida intrauterina, que é o aborto, não tem como punir por culpa. Há um homicídio doloso e uma tentativa de homicídio dolosa. Dolo eventual admite tentativa, o problema é que se vulgarizou o dolo eventual. Existe o caso de pessoas que conforme a circunstância do caso concreto, inclusive da embriague pode ser dolo eventual sim. Não dá para pensar que sempre se presuma que quem bebe assume risco, porque no caso da embriaguez do trânsito ninguém fica pensando que vai causar um acidente. Mas isso não significa que num caso concreto, conforme o grau de embriaguez, conforme as circunstâncias do local, conforme as peculiaridades do caso concreto o motorista bêbado não possa agir em dolo eventual, ele pode, o que não pode é fazer o que o STJ está fazendo, dizer que quem bebe assume risco! A embriaguez, o racha, têm virado uma presunção de dolo eventual. Se 2 motoristas participando de um racha, um deles vier a morrer ou atropelar um pedestre, a tendência é homicídio doloso por dolo eventual, porque quem participa de racha assume o risco de causar a morte de alguém, mas de alguém inclusive a minha e a do motorista com quem estou disputando, então o crime não será homicídio, e sim participação de suicídio. Não tenho como assumir o risco de causar a morte de alguém e não assumir o risco de causar minha própria morte, se nós dois colocamos em prática que reciprocamente um age com dolo de causar a morte própria e a do parceiro, é como os dois estarem dentro de um quarto com o gás aberto, isto é uma participação em suicídio! É complicado!

17) “A”, dias após o parto de seu filho, abandona a criança na porta de uma casa, movida pela circunstância de a gravidez não ter sido desejada. Os moradores da casa, entretanto, estavam em férias. Tendo em vista que ninguém avistara a criança no local, esta acaba morrendo em razão do frio rigoroso da madrugada, 16h após ter sido abandonada pela mãe. Dê o enquadramento jurídico-penal do fato, fundamentadamente.
-> Deixei meu filho na porta de uma casa, mas os moradores não estavam lá e a criança morre de frio, se a mãe quisesse a morte do filho, ela jogaria ele num dilúvio, se ela colocou a criança na porta de uma casa, então ela queria que a família cuidasse de uma criança viva, não de um cadáver. Aqui é o limite entre uma culpa consciente e uma culpa inconsciente, dá para trabalhar com um risco de deixar a criança na frente da porta de alguém, mas não tem como dizer que ela aceitou o resultado, porque ela não queria que a criança tivesse morrido. Seria um homicídio culposo. Daria para ser o abandono de incapaz também (art. 133, §2º). O importante é que essa morte seja culposa!

18) Certo dia, pai e filho dirigem-se a um circo que se encontra em atividade em Porto Alegre, a fim de verem os animais. Lá chegando, o filho pede pipoca ao pai, que, para satisfazer o desejo da criança, deixa-a sozinha vendo os macacos, enquanto ele se dirige ao pipoqueiro. Nesse interregno, o filho, movido pela curiosidade, passa por baixo de uma cerca (embora nela esteja pendurada uma placa vedando a passagem), e dirige-se à jaula do leão. O animal, percebendo a aproximação da criança, consegue, com um golpe certeiro, capturá-la e trazê-la para dentro da jaula, matando-a. Considerando-se que o responsável pelo leão deixou de alimentá-lo há aproximadamente 5 dias, embora sem o conhecimento do dono do estabelecimento, responda: a) alguém responderá pelo evento morte? b) Fundamente a sua resposta.
-> É um caso concreto que aconteceu em São Paulo! É um homicídio culposo, é algo não desejado, mesmo que a pessoa não alimentou o leão não necessariamente aceita como possível, ele não queria o resultado, pode haver uma previsão subjetiva, mas não há a aceitabilidade. Haveria um homicídio culposo para o pai da criança e ele terá o perdão judicial, e para o cuidador do leão será homicídio culposo também, aqui não há o “infelicita facti”, porque a ausência de alimentação pode deixar o leão numa situação mais arriscada! A placa que estava vedando a passagem mostra a minha postura que quem passar dela arca com o risco, há uma conduta imprudente do pai, que para buscar pipoca deixou a criança sozinha, há uma infringência do padrão social de conduta, o que se espera do pai minimamente diligente é que ele cuide do filho numa situação dessas! Não há uma fórmula matemática para colocar aqui! Num caso desse será aceito uma resposta bem justificada!

19) No dia X, a marquise de um restaurante de Capão da Canoa desaba sobre diversos pedestres que se encontravam no local. Dois deles vem a morrer instantaneamente, um vem a ter a perna amputada e seis resultam com escoriações leves. Instaurado inquérito policial para a apuração da responsabilidade criminal pelo ocorrido, fica comprovado que “A”, proprietário do estabelecimento, havia sido notificado, dois meses antes, pela Prefeitura local, para a realização de obra no local, haja vista a péssima condição que se encontrava a marquise. Também fica comprovado que “A”, diante dessa notificação, contratou o engenheiro “B” para a realização dos reparos, sendo que este apresentou laudo escrito atestando que a marquise não tinha risco imediato de desabamento e que a obra poderia ser feita após o término das férias de verão. Diante da narrativa, indique, fundamentadamente qual(is) o(s) crime(s) incidente(s), assim como a responsabilidade penal respectiva.
-> Caso da marquise de Capão da Canoa. Houve uma discussão grande aqui, porque no momento que o engenheiro disse que não vai cair, se o dono do restaurante responderia por crime culposo ou não, provavelmente sim, ainda que o engenheiro dissesse que a obra poderia ser realizada em março para aproveitar o verão, ainda assim estou trabalhando com uma situação de risco! Será culpa consciente, porque aqui ele contrata um engenheiro dizendo que a marquise tinha problema (ele não negou o problema), mas que ele poderia esperar, então o engenheiro responderia por crime culposo, porque ainda que o engenheiro tenha dito que eu poderia adiar um pouco a reforma, mesmo assim ele sabia que estava numa situação de risco. O laudo do engenheiro é muito útil para não aceitabilidade do resultado, mas não afasta a previsão subjetiva do risco, ele não podia dizer com certeza que não iria cair. O que se espera das pessoas é que não deixe chegar neste estado a marquise, o que se espera é que não deixe chegar no ponto limite! Tenho que trocar o pneu do carro antes de ele ficar impossível de andar. O que o engenheiro disse não tira a culpa do dono do restaurante, porque se ele tivesse tomado as precauções certas, a marquise estaria em boas condições e não teria caído!

-> A Teoria do Domínio do Fato é um critério de imputação de responsabilidade subjetiva, e não objetiva, não diz respeito a tipicidade objetiva do fato. A teoria do domínio do fato diz respeito a tipicidade subjetiva, ou seja, não é porque sou o chefe da transportadora que por eu ter o poder de mandar para a rua e contratar que isso vá me tornar responsável por todos os crimes praticados pelos motoristas da transportadora! O Domínio do Fato não é um critério de imputação objetiva do resultado, e sim de imputação subjetiva do resultado. É um problema de tipicidade subjetiva, o que significa afirmar que a Teoria do Domínio do Fato foi criada para transformar alguém que deseja o resultado e tem o poder transformá-lo, que ao invés de ser partícipe, que seja autor. Quando contrato alguém para matar uma pessoa, pode Direito Penal Clássico eu seria partícipe, porque eu não fui o executor, mas a Teoria do Domínio do Fato não abdica do liame subjetivo do resultado, quando eu contrato alguém para matar uma pessoa, eu quero o resultado morte, o que me difere de quem vai matar é que tenho o poder de decidir se a morte vai ocorrer ou não, então ao invés de eu ser partícipe, eu me transformo em autor, o que seria uma mera participação de menor importância passa a ser uma coautoria. Então a Teoria do Domínio do Fato é um critério de tipicidade subjetiva, o que significa que quem tem o domínio do fato vai responder pelo resultado, se deseja o resultado ou se o aceita.