terça-feira, 4 de junho de 2013

Direito Penal IV (04/06/2013)


Tentativa de Furto:

- Dos crimes onde a tentativa é mais interessante de ser abordada é o furto. Cabe tentativa, mas o problema é em que momento que cabe tentativa. Há casos em que a diferenciação entre atos executórios e preparatórios é de difícil diagnóstico no crime de furto. Ex.: Casos em que a pessoa é flagrada pulando a janela de uma casa, ou entala na grade, e a doutrina dá o exemplo de uma pessoa que é flagrada pulando a janela de uma residência, e surge o problema se aquilo seria uma tentativa de furto ou não. Caso do túnel que cavaram no Centro de Porto Alegre para chegar no cofre do Banrisul e a polícia acabou prendendo todos quando faltavam 3 ou 4 metros para chegar no cofre, estes exemplo ilustram bem a dificuldade que é identificada na incidência ou não de um ato executório no crime de furto. No caso da janela sendo pulada temos a dificuldade exatamente porque a tentativa de furto vai se verificar a partir do momento em que o agente dá início a conduta de subtrair, ou seja, quando há início de subtração, o problema é a pessoa que é que se flagrada pulando a janela de uma residência está dando início a subtração ou não? Tem autores que dizem que tudo leva a crer que ele vai praticar o furto, já poderia ser tratado como um ato executório, ou seja, trabalham com o critério de que o ato é inequívoco, ou seja, como é inequívoco que a pessoa vai furtar, já posso tratar como ato executório. Mas um ato ser inequívoco não pode ser considerado executório, posso ser flagrado numa interceptação telefônica mandando matar outra pessoa, é inequívoco, o traficante dentro do presídio flagrado mandando matar alguém, isso já seria tentativa de homicídio esta ligação? É inequívoco o que ele vai fazer, até mais inequívoco do que pular a janela de uma casa, mas esta ligação seria uma preparação. Então, o critério de ser equívoco ou inequívoco não é o melhor, e ai que está o problema, quem é flagrado pulando a janela de uma residência está executando uma violação de domicílio, uma conduta descrita no verbo nuclear de outro tipo penal (art. 150 do CP), mas furtando ele ainda não está, ele está furtando quando ele passa a ter o objeto com pelo menos um mínimo poder de disposição, ou seja, o objeto tem que estar no colo dele. É uma diferença que não é métrica, geográfica, não é uma régua que faz a diferença, mas é uma diferença muitas vezes complicada. Quem fica entalado na janela é tentativa de furto ou não? O professor acha que não, mas há muita doutrina dizendo que é! O mesmo problema do túnel até o cofre do Banrisul, foi tratado como tentativa de furto, mas ser flagrado 4 metros antes do cofre não parece ser tentativa, significa uns 2 ou 3 dias de escavação. Eles teriam que estar pelo menos entrando no cofre do banco para começar a falar em ato executório. Mesmo sendo evidente que eles iam furtar o banco mesmo faltando 4 metros ainda, mas também era evidente que eles iriam furtar 3 semanas antes quando eles começaram a cavar o túnel. Neste caso do túnel até o cofre do Banrisul acabaram sendo condenados por tentativa de furto, transitou em julgado, o TRF manteve a condenação.



“Coisa alheia móvel” e Bens Corpóreos (de expressão econômica):

Bens corpóreos podem ser furtados, mas não é qualquer bem corpóreo, é bem corpóreo de expressão econômica. Um cachorro pode ser furtado, por mais que seja vira-lata, por mais que tenhamos dificuldade em avaliar um cachorro, ele faz parte do patrimônio de alguém, é um bicho. Um animal é um bem corpóreo e tem expressão econômica, e isso significa que ele pode sim ser furtado, por mais que não tenha valor ou seja difícil avaliar. Gado é fácil de avaliar, mas cachorro não é! Um cadáver pode ser objeto de furto? Depende do cadáver, depende das circunstâncias da subtração, se eu estou furtando um cadáver durante um culto religioso, uma cerimonio religiosa de velório, por exemplo, eu não vou ter o crime de furto, porque eu não estou ofendendo o patrimônio de alguém, mas um cadáver do necrotério da Puc tem expressão econômica, o cérebro do Einstein está lá para todos os anos alguém tirar um pedaço e estudar, se alguém levar ele, será furto, tem expressão econômica. Então, tem que cuidar, por exemplo, a subtração de cadáveres pode caracterizar crimes contra o sentimento religioso dos mortos, que é quando é durante um velório, porque carregar o caixão de alguém não caracteriza uma ofensa patrimonial, mas subtrair o cadáver de um necrotério, que é pesquisado por uma faculdade, aquilo vai gerar um gasto da faculdade. Tem o crime de subtração de cadáver (art. 211 do CP) que é para os casos em que o patrimônio não é afetado, e sim o sentimento religioso dos morto. E também tem os casos de subtração de cadáver que caracteriza-se em furto. Órgãos humanos podem ser subtraídos? Até podem, e podem caracterizar furto, mas tem que cuidar, pois há uma lei específica para isso, que é a Lei 9.434, que encontra-se os crimes relacionados a extração ilegal de órgãos humanos, nos art. 14 e seguintes, isso pode ter expressão econômica, posso ter alguém que subtrai o órgãos  de uma pessoa viva e vende, aqui contém uma lei especial, não vai ser furto, isso vai sofrer incidência desta lei especial, então para o caso de órgãos e tecidos do corpo humano deve-se cuidar com a incidência da Lei 9.434, mas também tem que ter cuidado, pois podem ter casos que não se encaixam aqui, por exemplo, um hospital que tem um banco de peles, se tecidos forem subtraídos deste banco de peles, não vou ter incidência do art. 14 da lei 9.434, porque eu não estou removendo o tecido de alguém, já foi removido regularmente, então neste caso incidiria o furto. O art. 14 da Lei 9.434 vai se aplicar quando eu removo tecido, órgão ou parte do corpo de uma pessoa ou de um cadáver em desacordo com as disposições da lei, quando o órgão ainda está na pessoa viva ou morta, mas se o tecido, órgão ou parte do corpo já foi removido de acordo com a lei e depois vem a ser subtraído, posso ter um furto, que é o caso de no transporte de um coração para transplante, por exemplo, ele pode ter sido subtraído, isso pode sim ser furto, não se sabe quanto vale um coração, mas tem valoração patrimonial.

O conceito e coisa alheia móvel está atrelado a ideia de bens corpóreos, mas surgiriam a possibilidade de bens incorpóreos serem ou não enquadrados nesta elementar. Se tivéssemos apenas o art. 155, caput a resposta seria negativa, bens incorpóreos não se enquadrariam, ou seja, bens incorpóreos são aqueles que até podem ter expressão econômica, mas não têm corpo, por exemplo, direitos autorais. A subtração de um direito autoral é um furto de um bem incorpóreo, tem um tipo penal específico para isso que é o art. 184 do CP, crimes contra a propriedade intelectual são nada mais, nada menos do que furto de propriedade intelectual, mas propriedade intelectual não são bens corpóreos. Mas o art. 155 traz no §3º uma equiparação com coisa alheia móvel, está escrito que Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico”, então, energia elétrica não é um bem corpóreo, se não existisse o §3º, o “gato” de luz não seria furto, o legislador equiparou porque não é a mesma coisa, se fosse a mesma coisa não precisava equiparar, com um “gato” não estou furtando um fio de luz, e sim estou furtando energia elétrica, ou melhor, estou furtando o que eu tenho que pagar pela energia elétrica. Daí vem a discussão sobre o que se encaixa nisso. Surge um debate sobre a subtração de sinal da internet, sinal telefônico. Na déc. de 90 era muito caro fazer uma ligação telefônica para o exterior, e tinha um telefone no Iguatemi que por algum problema permitia fazer ligações telefônicas para o exterior sem pagar nada, e tinha fila na frente deste telefone público específico, isso é furto. Eu poderia considerar que eu estar utilizando uma linha telefônica sem pagar, quando eu deveria pagar, isso pode caracterizar furto? E daí chegamos ao caso contemporâneo que é o caso da NET, está muito caro pagar a NET, tem o ex-funcionário que foi demitido e passa na minha casa, cobra 100 reais para liberar todos os canais, ou para instalar a NET na minha casa e faz o “gato” da NET, isso caracteriza furto ou não? Vai caracterizar a equiparação do §3º ou não? Isso gerou muito debate e os tribunais, inclusive o STF chegou a conclusão de que o sinal da NET não se enquadra no §3º, o sinal da NET não é equiparado a energia elétrica para fins de incidência do §3º, e não sendo equiparado, não é passível de furto, é atípico o fato, mas isso não significa que a pessoa não possa se incomodar com isso, a operadora pode entrar com uma ação cível contra a pessoa, mas o argumento de não incidir no §3º é de que “qualquer outra” do §3º significa o que? Energia ou coisa? Parte da doutrina interpreta que é qualquer outra energia elétrica, então como o sinal da NET não é energia, estaria fora do §3º. Mas daí no caso de furtar água, só vai ser furto se eu colocar uma hidrelétrica dentro de casa? Se a água não acender bico de luz não é furto? Está longe de nós fazer um “gato” de luz, mas está bem perto de nós fazer um “gato” de NET, esse entendimento jurisprudencial é a prova clara de que quando o direito penal se aproxima de nós, sejamos quem somos, tendemos a dizer que não é crime. Quando a pessoa faz um “gato” de luz, ela faz porque a luz está cara, e acaba subtraindo o valor que ele teria que pagar por aquilo. Se eu entender que NET não está no §3º, vou ser obrigado a entender que o telefonema do Iguatemi é atípico da mesma forma, porque sinal telefônico não acende bico de luz da mesma forma, não é energia elétrica. No §3º entra “gato” de luz e só! Parece que se alguém tiver usando um sinal de internet que deveria se pago e não está sendo pago, pratica furto sim, se tem alguém usando um sinal e TV a cabo e teria que pagar e não está pagando também seria furto, a questão é que tudo que eu teria que pagar, que tem valoração econômica e eu estou deixando de pagar por causa de uma fraude dolosa minha, se equipara no §3º, ou seja, coisa alheia móvel é bem corpóreo, mas o §3º diz que equipara-se a energia elétrica ou qualquer outra coisa móvel que tenha valor econômico. A despeito da redação do § 3°, o STF entendeu (HC 97.261/RS) que “O sinal de TV a cabo não é energia, e assim, não pode ser objeto material do delito previsto no art. 155, § 3º, do Código Penal. Não há distinção técnica entre o dano patrimonial causado por aquele que faz um “gato” de energia elétrica, e aquele que faz um “gato” de TV a cabo. Animais podem ser furtados, partes do corpo humano que não estiverem ao alcance dos tipos penais previstos na Lei 9.434, e na condição de que tenham expressão econômicas, podem ser furtados, por exemplo, o cadáver de uma faculdade de medicina. Contudo, no caso de estar em jogo não o patrimônio, mas sim o sentimento religioso dos mortos e de seus familiares, o crime está definido no art. 211 do CP.



“Coisa alheia móvel” e Bens Mobilizáveis:

O conceito de coisa alheia móvel para fins penais não é o mesmo do direito civil, o direito civil considera bens móveis e imóveis com um estatuto jurídico próprio, uma casa e bem imóvel para o direito civil, uma árvore é um bem imóvel para o direito civil, para o direito penal tudo que pode ser mobilizado é coisa alheia móvel, posso furtar uma casa, se eu conseguir colocar ela em cima de um caminhão e levar embora é furto. Uma árvore pode ser furtada, a despeito de o direito civil tratar uma árvore como um bem imóvel. Um navio para o direito civil é tratado como bem imóvel, mas um navio pode ser furtado. Então, o conceito de coisa alheia móvel para fins penais não é mesmo do direito civil. Tudo que pode ser mobilizado e tem expressão econômica é passível de furto. Bens de valor inestimável se inserem no art. 155, por exemplo, quadros de família. Tem que ter avaliação do bem subtraído, daí às vezes alguém subtrai um rádio a pilha, ou o furto de 2 galinhas, talheres, prato velho, o perito dá uma olhada e mensura, diz quanto vale, mesmo que for 50 centavos. Então, tem que ter expressão econômica. Apesar de ser difícil de valorar um quadro de família, alguma expressão econômica tem, de graça não é, então estes bens de valor inestimável se inserem no art. 155.



“Coisa alheia móvel” e Bens de Uso Comum:

Os casos em que o bem subtraído é alheio, porém também esteja na propriedade do sujeito ativo, não se inserem no art. 155, mas sim no art. 156 do CP. Por exemplo, é muito comum quando abrimos uma sociedade (Ltda.), a empresa é minha, não quero um sócio, mas preciso de um sócio no contrato social para ter uma Ltda., então coloco um parente ou um amigo para colocar 1% das quotas, mas ele fica de fora, não tem administração, entrou só com aquele percentual, mas 1% da empresa é dele, e o que pode acontecer é que haja um estranhamento entre os 2 sócios, ainda que seja um só pro forma (o que tem apenas 1% das quotas), e este que é pro forma acaba causando um dano patrimonial, por exemplo, ele subtrai um carro da empresa, está registrado no nome da empresa, isso não seria furto, pois não é coisa alheia móvel, se eu tenho 1% do veículo, é meu também, e se também é meu, não é alheio. Isso é válido para caso de sociedade, herança, por exemplo, morre uma pessoa que deixa 3 imóveis, é instaurado um procedimento de inventario e enquanto não houver a partilha definitiva, o juiz nomeia um inventariante, que é quem vai administrar este patrimônio enquanto estiver tramitando o processo de partilha, os alugueis tem que ser administrados, como os alugueis, tem que fazer girar este patrimônio enquanto não há a partilha definitiva, e com muita frequência o inventariante, que normalmente é um herdeiro (não necessariamente) coloca a mão no patrimônio, ou seja, aquele aluguel que deveria ser depositado em juízo, ou ele combina quem aluga que paga 500, mas fica declarado 300, então o inventariante embolsa 200 que estão sendo pagos também, se o inventariante for um herdeiro também, ele está subtraindo um dinheiro que também é dele, pois ele também é herdeiro, e consequentemente não está no art. 155, por isso que há o art. 156, que é o furto de coisa comum, que é o caso para herdeiros, sócios, etc. E se o ladrão do Banco do Brasil é acionista do Banco do Brasil? Ações, é uma sociedade que tem capital aberto ou fechado, quando tenho ações de uma sociedade de capital aberto posso não ter direito a voto, mas tenho o percentual equivalente às minhas ações, o patrimônio daquela sociedade me pertence também, por mais que seja com ação.



“Coisa alheia móvel” e Bens Abandonados (res derelicta):

Bens abandonados, perdidos ou havido por erro de terceiro estão fora do âmbito de incidência do art. 155. Por exemplo, a bicicleta jogada no terreno baldio, não tem mais serventia, mas tem que ter o intuito de abandono, quem esquece a bicicleta na frente do muro não está abandonando a bicicleta, a coisa abandonada pressupõe o ânimo de abandono, não é só uma situação objetiva, se eu esqueci minha bicicleta encostada no muro não estou abandonando a bicicleta, pois ainda quero ela no meu patrimônio, mas se eu joguei a bicicleta no terreno baldio, é diferente, estou abrindo mão do meu patrimônio. Então coisa abandonada não é furtada! Quem acha objeto alheio não pratica furto, achado não é roubado, nem furtado, mas é apropriado, então é crime, tem no tipo penal do art. 169, p.ú., II o crime previsto para aquele que encontra objeto alheio, a pessoa tem 15 dias para entregar para a autoridade policial, então se eu achar 100 reais na rua, tenho 15 dias para entregar os 100 reais para uma autoridade policial, para que ela pesquise quem é  dono, se eu não entregar, estarei praticando o art. 169, p.ú. II. Da mesma forma quem se apropria de objeto por erro de terceiro é outro crime, é o art. 169, caput, por exemplo, o carteiro foi entrega o Sedex na minha casa, vi que não era minha, estava com o endereço errado, digo para deixar ali, o carteiro me entregou por erro, não subtrai nada, o problema da tipicidade é que no momento em que vem alguém e por erro coloca o objeto a minha disposição, não estou fazendo força, não estou subtraindo nada, por isso que preciso de outro tipo penal, que é o art. 169, caput, então objetos que tenham sido recebidos por erro de terceiro não são furtados, mas são apropriados (art. 169, caput).



Furto de objeto furtado é possível? Ladrão que rouba ladrão tem 100 anos de perdão? A maioria dos autores entende que não é novo furto, não caracterizaria um novo furto, um objeto que é furtado não seria passível de um novo furto. Então, a maioria da doutrina diz que não seria um novo furto, mas posso usucapir um bem furtado? Tem usucapião de boa-fé e de má-fé, de bens moveis e de bens imóveis, a pessoa que invade um terreno sabendo que não é dela, pode usucapir aquele terreno, tem um prazo (10 anos), ou seja, a posse de má-fé pode gerar usucapião, no momento que a pessoa entrou no meu terreno, tenho 10 anos para tirar ela de lá, ou pelo menos para adotar uma providência para tentar tirar ele de lá, se eu aquiescer, não fizer nada, ou não tomar conhecimento, azar, quem tem um terreno e durante 10 anos não passa na frente dele, azar dela! Isso é muito comum na praia, tem terrenos em que alguém faz um puxadinho e se instala em 10 metros do terreno que tem 300m², o proprietário vê, mas não dá muita bola para não se incomodar, passam 10 anos, e o cara usucapi e leva parte do terreno, isso é um usucapião de posse de má-fé, é possível! Para bens moveis também há usucapião com posse de má-fé, um carro furtado pode ser usucapido, se ele for utilizado de maneira ostensiva, normalmente o ladrão do carro pode adquirir a propriedade do carro após um período (mais ou menos 5 anos), se durante 5 anos ele usar ostensivamente, e o dono não conseguir recuperar o veículo, ele vai adquiri a propriedade deste carro. Quem invadiu meu terreno sabe que o terreno não é dele, no caso do carro é a mesma coisa, a única diferença é que o terreno não levo embaixo do braço, e o carro sim. Bens móveis com posse de má-fé podem ser usucapidos, tem alguns pressupostos, só sou consumidor se exercito esta posse de maneira ostensiva, se eu esconder este veículo durante 5 anos, isso não gera usucapião, mas se eu utilizar o veículo normalmente durante 5 anos, eu tenho posse dele. Daí fica a pergunta: Se o veículo furtado gera a posse, porque ele não pode ser novamente furtado? O furto protege a posse e a propriedade, diz a doutrina, então um novo furto seria um novo furto, ou seja, a vítima não seria o dono do carro, e sim seria o ladrão que furta o carro. A maior parte da doutrina entende que não é possível um novo furto de objeto furtado.



Art. 181 CP: Crimes contra o patrimônio (estelionato, apropriação indébita) são isentos quando entre cônjuges, então furto entre cônjuges está liberado, roubo não, não pode haver violência ou grave ameaça. Isso também pode ocorrer em casos de união estável, e inclusive em relações homoafetivas. Mesmo se os cônjuges se separam de fato, mas não se divorciaram, pode incidir o art. 181 CP, mas até pode haver ação cível no caso. Não é só para cônjuges, o art. 181 também fala em ascendentes e descendentes, contra avôs e pais também não é furto, incide o art. 181 CP. Contudo, o art. 181 não se aplica caso o idoso tenha mais de 60 anos (isso veio com o Estatuto do Idoso). E também não se aplica ao terceiro que se insira nas suas condições. Ver art. 183.

Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo:

I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;

II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.



Tipicidade Subjetiva:

“Para si ou para outrem”: Se eu subtrai o pertence de alguém e deixar num canto (local público) para outra pessoa que eu nem sei quem é levar, é furto! Contudo, casos existem em que a subtração de um bem pode não estar direcionada para si ou para outrem. Por exemplo, um sujeito que morava num condomínio de apartamentos, tinha um vizinho que tinha um cachorro que latia o dia e a noite inteira, ele já tinha esgotado tudo que ele podia para o vizinho dar um jeito no cachorro, teve um dia que ele estava na área comum do condomínio, o cachorro estava passeando por ali, longe do dono, ele pegou o cachorro, colocou no carro e deixou ele numa estrada a 40 km longe, a câmera do condomínio filmou colocando o cachorro dentro do carro e isso foi parar numa Delegacia de Polícia, qual crime é esse? Cachorro é coisa alheia móvel, tem valoração econômica, mas ele subtraiu para si ou para outrem? Essa elementar subjetiva fica capenga, porque é diferente eu subtrair o objeto e deixar no banco da praça para alguém levar, pois alguém vai levar, mas neste caso do cachorrinho, ele largou o cachorro no meio do mato, a conduta não é praticada com o pretexto de alguém levar o cachorro. O dolo dele não é que outrem pegue, é diferente eu largar um objeto no banco da praça, onde o “para outrem” está bem claro, ou seja, alguém vai levar, se ele tivesse o elemento subjetivo de outrem ficar com o cachorro, ele não teria largado a 40 km, e sim teria largado no pátio de uma casa, ou na rua da cidade, então esse caso gera dúvida, parece demais enquadrar um furto, mas não se pode dizer que está errado dizer que é furto!



Dolo: Vontade e consciência de estar subtraindo coisa alheia móvel. Dificilmente haverá furto em que o dolo seja questionável.



Excludentes da Tipicidade:

Erro de tipo incriminador: Quando o agente subtrai bem alheio pensando ser próprio. Neste caso, como o furto não é punível na forma culposa, o fato será atípico, ainda que o erro seja escusável.



Princípio da Insignificância: Tem uma jurisprudência bem fragmentada sobre a insignificância. O Princípio da Insignificância decorre de uma noção de tipicidade material para reconhecer que o tipo penal não incide em todo e qualquer hipótese formalmente, eu preciso de uma ofensa materialmente relevante para ter incidência. Por exemplo, se no intervalo da faculdade um aluno pegar o clip de um colega que está no estojo dele, formalmente este aluno está subtraindo coisa alheia móvel, mas para incidir o direito penal, preciso de algo mais, de uma lesão considerável. Essa discussão que é suscitada no princípio da insignificância, ou no crime bagatelar, na doutrina é muito tranquilo que o princípio da insignificância exclui a tipicidade de alguns crimes, dentro eles o furto. Se a lesão for de pequena monta, a ponto de não justificar o custo-benefício da intervenção penal, pode-se reconhecer a exclusão da tipicidade material, isso é nada mais, nada menos do que a aplicação do princípio da proporcionalidade do direito penal, o direito tributário faz isso, o direito administrativo faz isso, e o direito penal quando tenta fazer isso é um problema, porque na doutrina é meio tranquilo que dá para aplicar a insignificância no crime de furto (como em outros crimes também), na jurisprudência não é tão tranquilo, há uma fragmentação, de os tribunais de apelação não admitirem consensualmente, e o STJ e o STF têm admitido, pois eles trabalham com um volume muito grande de casos, já fazem filtro de proporcionalidade para tudo, para recurso subir, e quando eles se deparam com uma tentativa de furto de 2 galinhas, por exemplo, eles aplicam atipicidade, vão aplicar o princípio da insignificância. A jurisprudência do nosso TJ, ela é bem vacilante, há vários acórdãos dizendo que furto não interessa o valor, é furto, tem que reprimir, daí sobe para o STJ a melancia furtada, laranja, alinha, shampoo pela metade, sabonete usado, etc, é impressionante o que vai parar no STJ e no STF.

-> Os argumentos para não aceitar a insignificância no crime de furto: Muitos acordão se baseiam no §2º do art. 155 que diz que “Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa”. O que vem se entendendo como “pequeno valor da coisa furtada” é inferior a 1 salário mínimo (aproximadamente 600 reais), então alguns acórdãos vem entendendo que como o legislador trouxe a solução legal para a insignificância, ele disse que não posso absolver, tenho que condenar, até posso substituir a pena de reclusão por detenção, diminuir de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa, mas para tudo isso tem que condenar, então não seria aplicável o princípio da insignificância porque o §2º traria uma solução diferenciada para furtos de pequeno valor. Ademais, dizem estes acordos que hoje o JEC foi criado exatamente para tutelar estes casos de pequena monta. O argumento muito útil é que há o ...

-> Os argumentos para aceitar a insignificância no crime de furto: Dizem que “pequeno valor” é abaixo de um salário mínimo, então uma bicicleta usada tranquilamente vai ficar aqui, mas não necessariamente vai ser um furto insignificante, ou seja, pequeno valor pode atrair o §2º, mas uma coisa é um bem avaliado em 500 reais, outra coisa é um shampoo pela metade no valor de 2 reais. O §2º se aplica ao furto que não é insignificante, porém o valor da coisa furtada é inferior a um salário mínimo, porque não há um parâmetro objetivo sobre o que é algo insignificante, eles avaliam no caso concreto.

Então, tem jurisprudência entendendo que o §2º não obsta a incidência da insignificância, e da mesma forma afirmam que tudo bem, criaram o JEC, mas não é por isso que tenho que dizer que o furto de um clips em sala de aula vai ter que parar num processo judicial, numa ação penal. Então, tem argumentos para os dois lados!

Não há o argumento que para a vítima pobre pode ter relevância, como uma Havaiana para alguém com dinheiro não é muito cara, então não vai ser furto, mas para um pobre que só tem aquela Havaiana tem relevância, será furto, porque se trabalhar com este argumento, pode chegar a conclusão de que, por exemplo, o furto do carro de um milionário é atípico, porque para ele não vai fazer diferença um carro a mais ou um carro a menos, e não se pode admitir isso! A significância é avaliada objetivamente, não de acordo com disponibilidade financeira maior ou menor da vítima. Não se pode entrar no sentimentalismo para avaliar se se o bem é significante ou insignificante, uma Havaiana é uma Havaiana, a análise da significância ou não da ofensa é feita objetivamente. Se for olhar para a vítima, chegarei a conclusão que furtos de valores consideráveis em detrimentos de empresas multinacionais em que o patrimônio é absurdo, não teria relevância penal, mas isso não dá! É objetivamente que se avalia o valor de um bem! Se quiser puxar o §2º até dá para discutir, mas Havaiana para a vítima pobre pode ter relevância, não dá! O interesse da vítima importa no direito civil, no direito penal não!



Furto e Ilicitude:

Furto famélico: É o nome técnico designado para o furto praticado em estado de necessidade (art. 24 do CP), é o furto praticado para saciar necessidades vitais, por exemplo, roubar pão para dar para os sobrinhos comerem. Exigem todas as condicionantes do art. 24 para a exclusão da ilicitude, ou seja, situação de risco atual capaz de autorizar uma lesão inevitável e proporcional a bem alheio. Necessidades vitais, isso vale para comida, remédios, quem furta um cobertor numa madrugada fira de inverno pode discutir furto famélico também. Famélico não vem de fome, vem de falência. Ex.: Sujeito tinha filho que estava doente e exigia medicamentos de uso regular bem caros, ele não estava conseguindo o medicamento em meio público gratuitamente, então ele acabou vendendo a arma da corporação, foi processado criminalmente e alegou que vendeu a arma da corporação para conseguir dinheiro par comprar remédio, naquela semana o remédio do filho tinha acabado, não tinha na rede pública e ele precisava comprar o remédio, mas trancou a alegação dele no curso do processo porque conseguiram um extrato da conta corrente dele naquela semana e ele não tinha dinheiro, mas o cheque especial dele cobria 2 meses do medicamento, então acabaram alegando que como ele tinha uma maneira muito mais fácil e rápida de conseguir acesso a algum dinheiro para conseguir comprar o medicamento antes de vender a arma, esta tese acabou sendo obstada. Outro exemplo é um sujeito que estava cumprindo pena por diversos outros crimes, mas um deles chamou a atenção, pois ele era um papeleiro que morava na Biboca da Castelo (embaixo da Ponte do Guaíba), ele estava andando pela Farrapos em direção a casa dele e ele passa por um sobrado com a porta entreaberta que dava para a cozinha, ele entra na casa, abre a geladeira, pega uma caixa de suco longa vida pela metade, um tubo de mostarda e um pacote e pão que também estava pela metade, na hora que ele estava saindo da cozinha furtando esbarrou numa panela e o dono da casa veio e pegou ele no flagra saindo com os alimentos embaixo do braço, e daí foi preso em flagrante, pois estava no semiaberto por outros fatos, e acabou sendo processado criminalmente por este fato por tentativa de furto, o que chamou a atenção na sentença foi o argumento utilizado, a defensoria pública na ocasião alegou primeiro princípio da insignificância, e em segundo furto famélico para ele, o juiz não acolheu a insignificância e quanto ao argumento do furto famélico o juiz alegou primeiro que não havia prova concreta de que ele estava passando fome naquele momento, e o segundo argumento foi que ele não era nem tão pobre, porque na casa dele tinha até uma televisão, e o juiz também disse que ele tinha outras formas de conseguir dinheiro para comprar comida, pois hoje quem fica numa sinaleira o dia inteiro pedindo dinheiro já consegue dinheiro para comer, seria melhor que ele tivesse dito que não aceita furto famélico.



Furto no Repouso Noturno (§1º) – Majorante:

Só se aplica ao furto simples, não ao furto qualificado (§4º), não porque vem antes do §4º, e sim porque numa escala hierárquica a maior censura vem com as qualificadoras, a censura intermediaria vem com a majorante. Se o legislador entendesse que o repouso noturno deveria incidir no furto qualificado, ele teria colocado o inciso V como qualificadora se o furto for em repouso noturno, o fato de ele ter tratado isso como majorante indica que a pretensão não era incidir em qualificadoras, e sim apenas no furto simples.

O fundamento do aumento da pena é a vulnerabilidade da vítima ou a maior dificuldade de evitar o crime de parte do Estado. Tem que escolher o fundamento. Se entender que é uma maior vulnerabilidade da vítima, em casa desabitada e em estabelecimento comercial não incidiria. Mas se entender que é por uma maior dificuldade de o Estado evitar o crime, em casas desabitadas e em estabelecimentos comerciais incidiria. O problema é esse, o furto praticado na casa da praia, isso vai sofrer a incidência da majorante se não tiver ninguém morando lá no momento? Se entender que o fundamento é a dificuldade do Estado em reprimir o fato, a resposta é sim. Para o professor incide sim, pois é mais difícil reprimir o crime mesmo, mas há acórdãos discutindo se incide em caso de casa desabitada e estabelecimento comercial.

Para ser um furto majorado teria que pensar na casa de praia desabitada em que alguém esqueceu a porta aberta, e eu sozinho entrando durante a madrugada, porque se eu tiver acompanhado de alguém, o furto já é qualificado pelo concurso de pessoas, se eu arrombar a porta, o furto já é qualificado por arrombamento. Pulei um muro de 1 metro sozinho para levar a bicicleta durante a noite, será um furto durante repouso noturno. Se o muro tiver 2 metros já tenho a qualificadora da destruição, rompimento de obstáculo para a subtração da coisa (§4º, II, mediante escalada). E se incidir uma qualificadora, o §1º já estará descartado.

A questão do horário a jurisprudência diz que é um conceito regional, ou seja, varia de região para região, repouso noturno em Porto Alegre é uma coisa, no meio rural é outra. No meio rural, por exemplo, às 10h da noite já estão dormindo há muito tempo, e às 5h da manhã já estão acordados. O que vem sendo interpretado é que no meio urbano o repouso noturno é da meia noite às 6h da manhã, no meio rural eles antecipam um pouco, 10h da noite eles já passam a considerar repouso noturno. O que todos falam é que depende do lugar, não pode dizer que é da meia noite ás 6h da manhã em todo lugar, pois se for no meio rural isso pode mudar!

Tudo depende da correta compreensão do fundamento do §1º, ou seja, se é a maior vulnerabilidade da vítima, ou se é a maior dificuldade de repressão do Estado, se olho para a vítima, se ela não está em casa, não incide, como uma casa da praia em que as pessoas não estão, em estabelecimento comercial ninguém mora, então não se aplicaria também, mas se olhar para a maior dificuldade de repressão do Estado, incidiria no caso de casa desabitada e estabelecimentos comerciais.

Aplica-se a coautores e partícipes? Não, porque se houver coautoria e participação seria furto qualificado.

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