terça-feira, 27 de março de 2012

Direito Administrativo II (27/03/2012)

Processo Administrativo
(Princípios – Continuação)

-> O processo administrativo é considerado um ato da administração, ele envolve uma sucessão ordenada de vários atos que envolvem a recepção de documentos, realização de diligências, e esses atos que são atos administrativos.
* Princípio da Gratuidade: Art. 2º, § único, XI, Lei 9.784/1999 – princípio amplo, porque já tem jurisprudência e súmula vinculante tratando da matéria, a ideia é que os processos administrativos em regra não envolvam cobrança de custo do âmbito da administração, mas isso é regra, e tem suas exceções. A primeira forma de excepcionar isso está previsto na própria lei 9.784, que ela diz “ressalvados os casos previstos em lei”, então determinadas leis específicas regulamentando processos administrativos poderão prever algum tipo de cobrança de taxa. Mas a regra é que em se tratando de processo que envolva restrição de direito, algum risco de prejuízo ao particular, como uma multa ou apreensão de mercadoria, algum efeito que possa trazer algum prejuízo para o particular, se aplica o princípio da gratuidade, para permitir o acesso do administrado à administração. Então o sujeito não vai ser privado de seus bens/direitos sem que tenha a chance de poder exercer seus direitos de defesa. Mas esse princípio não é irrestrito, não se aplica a todos os processos administrativos, mas a regra é que nos processos que possa trazer algum risco de prejuízo ao particular tem que ser gratuito, mas nos outros casos depende, pois há exceções. O processo que envolve a contratação de servidores é um exemplo de um processo não gratuito, pois tem a cobrança da taxa de inscrição (que às vezes é bem alto) e visa muitas vezes remunerar a empresa que está realizando o concurso e dar suporte material para realização do concurso, mas tem uma regra geral que quem não tem condições de pagar pode fazer o concurso sem pagar a taxa. Essa questão da gratuidade tem que cuidar primeiro que ela não se aplica a todos os processos, mas a regra deve ser a gratuidade dos processos administrativos, assegurando que se a administração é pública, aquele que tiver algum prejuízo tem o direito de exercer essas garantias legais com relação a defesa e contraditório. Diferentemente do que ocorre no processo judicial que tem que pagar as custas de distribuição, da condução do oficial de justiça, uma série de custos relacionados com o processo em si e o desenvolvimento do processo, aqui a regra é que não se paga por isso, exceção feita a essas ressalvas legais que podem acontecer.  Súmula/STJ 373 e Súmula Vinculante/STF 21: essas 2 súmulas tratam do recurso administrativo. Pensamos muito na gratuidade na questão da propositura do processo, na instauração do processo, mas a gratuidade vai acompanhar o processo. O processo era gratuito até o recurso, por exemplo, tenho uma multa de trânsito, ou aplicada pela ANVISA, pelo Banco Central, pela CBN, apresento minha defesa, chega a administração e diz que a multa deve mesmo ser aplicada, pois foi constatado o ilícito/infração e fiquei inconformado com isso, quero recorrer, então a administração diz que não tem problema desde que deposite o valor da multa, se eu não tiver o dinheiro não posso recorrer, então se achava uma medida intermediaria, como dar um bem em garantia, mas às vezes também não adianta, então isso inviabilizava a possibilidade do recurso, então depois de muito se discutir essa gratuidade foi estendida também aos recursos, então a gratuidade envolve também a impossibilidade de cobrança por parte da administração de depósito recursal ou de garantia para o sujeito poder recorrer, agora não precisa mais depositar nem garantir, basta exercer seu direito de recurso, que envolve também o contraditório e a ampla defesa. Esse princípio se estende por todo processo, desde a instauração até aos recursos administrativos, agora sumulados.
Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
XI - proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei;

Súmula/STJ 373: É ilegítima a exigência de depósito prévio para admissibilidade de recurso administrativo.

Súmula Vinculante/STF 21: É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo.
* Princípio da Atipicidade – é um princípio clássico do direito administrativo, pois é um princípio tradicional no direito administrativo, mas de uns anos pra cá vem sendo questionado às vezes. Tipicidade do direito penal: significa que em se tratando de um fato punível, para ser considerado crime deve estar previsto de maneira expressa a conduta que pode ou não ser praticada, se o ato for praticado de uma maneira contraria ao que diz a lei o fato será atípico, por exemplo, se a lei diz que a vantagem tem que ser pessoal, mas na verdade foi de outro, então o fato foi atípico. A regra no direito administrativo é o contrario, o fato, para ser punível não precisa em princípio estar tipificado, ou pelo menos não precisa estar disposto da mesma forma que numa norma penal, não precisa chegar naquele pormenor. Há condutas que são puníveis no direito administrativo que comportam alguns desdobramentos, por exemplo, uma sanção que pode decorrer de um processo licitatório, pode ser aplicada uma multa a alguém que descumpriu uma cláusula de um contrato firmado com a administração pública, aqui deixamos em aberto, há uma previsão legal que faz referência ao descumprimento de alguma cláusula, mas não preciso arrolar detalhadamente o que o sujeito vai fazer para ser sancionado. É uma disposição que segue em certa medida um grau de abertura grande, por exemplo, dizem que um servidor tem uma conduta que não é leal a instituição na qual ele trabalha, isso é um conceito jurídico indeterminado que vai ter que ser preenchido no caso concreto, no direito penal isso se evita, lá a questão é objetiva. Esse princípio da atipicidade vem sendo cada vez mais questionado pelo poder judiciário, a doutrina ainda adota ele e grande parte dela o refere, mas o fato é que o poder judiciário cada vez mais tem invocado a necessidade de uma tipificação da conduta também no direito administrativo. Até é justificável e compreensível que principalmente em se tratando de um processo restritivo de direitos, de um processo administrativo punitivo o que vemos é uma aproximação muito grande com o processo penal, não é a toa que se busque elementos no processo penal para preencher as lacunas deixadas pelo processo administrativo. A essência do processo é a mesma, ambos aplicam sanções, o que os diferencia é a intensidade/o grau das sanções, enquanto o processo penal aplica uma pena restritiva de liberdade, o processo administrativo vai aplicar uma pena pecuniária, uma multa, ou uma demissão, pode envolver uma apreensão de mercadorias, mas em ambos os casos estamos diante de sanções, ambos têm o caráter punitivo. Tem uma aproximação dos princípios do processo penal e do processo administrativo. Como regra não precisa estar a conduta descrita de maneira pormenorizada na norma administrativa, como está no código penal, mas é importante que se tenha uma preocupação cada vez maior com a mitigação/a relativização desse princípio da atipicidade, cada vez migramos mais para fatos mais fechados, mais típicos.
* Princípio da Pluralidade de Instâncias – no âmbito da Lei 9.784 está previsto de maneira expressa no art. 57. Esse princípio é o direito que tem a parte de ver o seu processo revisado. Assim como acontece no processo judicial que tem a decisão do juiz de 1ª instância e aquele que estiver inconformado pode apelar/recorrer ao tribunal, e às vezes até recorrer para os tribunais superiores, criando uma 3ª e 4ª instância, no caso do processo administrativo se estabelece também essa possibilidade de revisão, a parte tem o direito de que seu processo seja revisto, minimiza-se o erro, se a comissão processante entende que o sujeito deve receber uma pena e a parte inconformada quiser recorrer, ela tem a possibilidade de recorrer a uma instância superior, então a Lei 9.784 estabeleceu um patamar máximo de instâncias, para evitar que o processo administrativo não tenha fim, aqui o máximo são 3 instâncias, salvo disposição legal em contrário. A questão é permitir a revisão, uma nova analise do processo, e isso está incluído dentro do princípio da ampla defesa, que a parte tem o direito de recorrer. Às vezes, excepcionalmente esse princípio da pluralidade de instâncias fica comprometido, porque tem determinadas autoridades, determinadas pessoas que têm prerrogativas de foro que às vezes mais atrapalha do que ajuda, por exemplo, se o sujeito é o dirigente de uma instituição, de uma autarquia e o processo administrativo dele só poderia correr perante o ministro do estado o qual ele está vinculado, nesse caso não tem como decorrer. Salvo essas situações excepcionais a regra é a pluralidade de instâncias, a possibilidade de revisão do processo, minimizando o erro, mas não o evita. Exemplos de alguns processos administrativos que têm instâncias organizadas/ordenadas: No âmbito do Banco Central e da CBN as decisões tomadas podem ser objeto de recurso para o Conselho de Recurso do Sistema Financeiro. Em matéria tributária, no âmbito das decisões tomadas pelos auditores da receita existe o Conselho de Contribuintes, que é um órgão revisor. No âmbito previdenciário também existem os Conselhos da Previdência que analisa em grau recursal as decisões tomadas no âmbito do INSS. No âmbito do estado do RS temos para as decisões dos auditores estaduais na área tributaria o Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais (TARF). No âmbito do município de Porto Alegre tem o Tribunal Administrativo de Recursos Tributários (TART). Esses são exemplos de órgãos revisores respeitando esse princípio da pluralidade de instâncias.
Art. 57. O recurso administrativo tramitará no máximo por três instâncias administrativas, salvo disposição legal diversa.
* Princípio da Economia Processual – esse princípio está tanto no processo judicial, civil, penal e trabalhista quanto no administrativo. A ideia da economia processual é reduzir o custo do processo, dentre as medidas possíveis/necessárias a serem adotadas no processo tem que se ver se tem uma menos onerosa, menos custosa para a administração, se tem a administração deve adotar essa menos onerosa, mas não se deve violar direitos do administrado, como deixar de realizar uma perícia ou uma oitiva da testemunha só com base na economia processual, não é isso. Mas se tenho como tomar essa medida de uma maneira menos onerosa, menos custosa para a administração, vou adotar essa medida menos onerosa. Se a medida exigida pelo administrado é descabida/meramente protelatória, a administração não vai adotar isso, vai justificar e vai deixar de adotar, por exemplo, a testemunha abonatória, que não sabe o que aconteceu do fato, mas vai lá só pra dizer que o sujeito tem uma boa conduta, até tem seu valor para demonstrar a boa conduta do sujeito, mas às vezes não tem o menor sentido, como arrolar 50 testemunhas abonatórias. Algumas medidas atentam contra a serenidade do processo e contra a economia processual, que envolve duas coisas, o custo efetivo/financeiro e o tempo/custo processual (que também é custo). A quem diga que perder o tempo é pior, porque não tem como recuperar e o dinheiro sim! A ideia do princípio da economia processual está relacionado com a eficiência/serenidade, envolve a ideia de que dentro das medidas possíveis, dentro das medidas a serem adotadas pelo processo administrativo tem que se adotar aquela que é menos onerosa.
* Princípio da Verdade Material – poderia ser denominado de outra maneira, como princípio da verdade verdadeira para chamar a atenção de que o processo administrativo, diferente do que ocorre no processo judicial, a administração tem uma maior liberdade de atuação. Em se tratando de processo cível pelo princípio da inércia da jurisdição, o juiz é um 3º imparcial, precisa ser provocado para o processo ser instaurado e a partir dai as partes vão trazer para ele elementos que ele vai jugar de acordo com aqueles elementos colhidos no processo, vai levar em conta os elementos que estão nos autos, essa forma de julgar, alguns autores falam da verdade formal, ou seja, independentemente do que de fato aconteceu vai valer num processo judicial aquilo que está contido no processo que está sendo analisado, nos autos vão constar os elementos que vão embasar a decisão do juiz. Em se tratando de administração pública/processo administrativo, ela não vai se contentar com aqueles elementos mantidos processo, o princípio da verdade material diz que a administração tem o dever de procurar/descobrir o que de fato aconteceu, ela não fica restrita aos elementos apresentados no processo, tem que ir atrás, se ela acha que é importante realizar uma perícia, se ela acha que aconteceu algo que não está no processo ela tem o dever de ir atrás da verdade e tomar medidas cabíveis. Se por um lado a administração tem o poder/dever de agir de ofício, buscar os elementos necessário para a solução das dúvidas surgidas no processo, ela também tem o compromisso de buscar sempre a realização do interesse público, e esse interesse público vai ser alcançado a partir da constatação da real situação dos fatos, vai se apurar aquilo que realmente aconteceu da forma como realmente aconteceu aqueles fatos, se a administração descobre determinada situação, ela vai atrás e busca saber se de fato isso está correto ou não. Diferentemente do processo judicial/cível em que as partes são opostas, tem um autor e um réu, um dizendo que sim e outro que não, no caso da administração não tem essa contraposição, essa relação de litigância, a administração busca apurar os fatos da maneira que aconteceram. É uma verdade aqui se distingue da verdade formal do processo judicial.
* Princípio da Participação Popular: Art. 31 a 33 da Lei 9.784/1999 – essa ideia de participação popular está dentro de um contexto maior que alguns autores chamam de Administração Consensual ou Administração Participativa, a ideia de uma administração que seja compartilhada entre os agentes públicos e os administrados, deve-se combinar esforços para dar uma maior legitimidade para a atuação administrativa. A ideia de concerto, um acordo entre as partes para chegar a algo que agrade todo mundo, porque afinal a administração deve ser pública. Essa figura da administração consensual fez surgir uma série de elementos que envolvem a participação popular nas decisões administrativas, hoje isso é cada vez mais possível buscar a participação popular através de consultas pela internet, atreves de processos virtuais, envolvendo medidas que vão desde uma audiência pública até questões relacionadas com referendos, desde assuntos administrativos até eventuais assuntos de natureza política. O art. 31 fala em consulta pública, a possibilidade que tem a administração antes de decidir sobre determinada medida consultar as partes que queiram se manifestar sobre esse assunto, como uma questão ambiental, considerando que se trata de um interesse difuso a administração poderia abrir espaço para que os interessados se manifestassem, realizar uma consulta pública, permitindo dar uma maior legitimidade a essa decisão. Art. 32 fala em Audiência Pública: diz que antes de tomada a decisão, diante da relevância da questão, poderá ser realizada audiência pública para debates sobre a matéria do processo, um dado curioso é que tem alguns casos de processo judicial que o STF abre espaço para esses debates também, como na decisão sobre aborto dos fetos anencéfalos, foram ouvidas associações médicas e religiosas (quem tivesse interesse), para legitimar o processo também, isso porque essa decisão envolveria a todos a partir de então. Art. 33 fala em criar outra possibilidade que não seja debate, nem consulta, nem audiência, mas permita a participação popular, por exemplo, abrir uma votação pela internet. Ainda não são procedimentos usuais no processo administrativo, mas a lei abriu essa possibilidade.
Art. 31. Quando a matéria do processo envolver assunto de interesse geral, o órgão competente poderá, mediante despacho motivado, abrir período de consulta pública para manifestação de terceiros, antes da decisão do pedido, se não houver prejuízo para a parte interessada.
§ 1o A abertura da consulta pública será objeto de divulgação pelos meios oficiais, a fim de que pessoas físicas ou jurídicas possam examinar os autos, fixando-se prazo para oferecimento de alegações escritas.
§ 2o O comparecimento à consulta pública não confere, por si, a condição de interessado do processo, mas confere o direito de obter da Administração resposta fundamentada, que poderá ser comum a todas as alegações substancialmente iguais.

Art. 32. Antes da tomada de decisão, a juízo da autoridade, diante da relevância da questão, poderá ser realizada audiência pública para debates sobre a matéria do processo.

Art. 33. Os órgãos e entidades administrativas, em matéria relevante, poderão estabelecer outros meios de participação de administrados, diretamente ou por meio de organizações e associações legalmente reconhecidas.

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