segunda-feira, 20 de maio de 2013

Direito Civil IV (20/05/2013)



Arras ou Sinal (Art. 417 – 420)

1. Conceito: Arnaldo Rizzardo: “Em direito das obrigações o vocábulo arras expressa a quantia dada por um dos contratantes ao outro como sinal de garantia da conclusão do negócio. Não só o dinheiro pode servir como garantia ou sinal, mas igualmente qualquer coisa fungível. O escopo principal é firmar a presunção de acordo final, tornando obrigatório o ajuste e também, embora mais raramente assegurar para cada um dos contratantes o direito de arrependimento.”
Ex.: Os colegas da turma tem interesse em locar um imóvel em Torres entre os dias 28 de dezembro de 2013 e 05 de janeiro de 2014. Ou por internet ou presencialmente acertamos com o locador o contrato pelo qual pagaremos 5 mil reais para permanecer lá por 1 semana e o locador oferece o bem em condições de uso. Um contrato banal o dia a dia. Pode o locador exigir um início de pagamento, deposite mil reais como sinal (princípio de pagamento), os outros 4 mil, paga depois do período convencionado para o uso. Estes mil reais são chamados de arras ou sinal. Deixei 10 peças de roupas na lavanderia, me exigiram 50% do serviço. Isso seria uma espécie de sinal.
2. Funções (5 principais): Embora as arras permitam alcançar as 5 funções, nem sempre estão em todos os contratos, é possível que alguém utilize o arras para alcançar 2 funções, outra pessoa para 3 funções, etc. Potencialmente os arras desempenham 5 funções, as partes que decidem quais querem alcançar.
     2.1. Garantir o negócio: Muitas vezes começamos negociações e às vezes mudamos de opinião. Por exemplo, tenho interesse em comprar 30 garrafas de Champagnat, contato um fornecedor, ele diz que é muito bom, tenho algumas opções de preço e qualidade, e vou negociar sem obrigação de fechar contrato. A 1ª função das arras seria: No momento em que o magistrado toma conhecimento que foram prestadas as arras, o magistrado forma a convicção de que há um contrato, de que as partes saíram da parte de negociação (onde as partes são livres para fechar negócio ou não) e formaram um contrato, então este negócio está garantido, este negócio tem a tutela do direito. Por exemplo, acertaram a compra e venda de 50 garrafas de Champagnat e uma das partes já ofereceu 5 garrafas para a outra, ou uma das partes já ofereceu 100 reais de sinal, uma parte ofereceu 5 garrafas ou 100 reais, porque nós ficamos convictos de que há um negócio jurídico que vai justificar este pagamento inicial, foi garantido o negócio, a partir dali a parte tenho que sair correndo para conseguir estas 50 garrafas que prometi, e a partir dali a outra parte tem que encontrar os 1,5 mil reais que ela se comprometeu a pagar, porque o negócio está fechado. É um contrato onde há a cláusula de arras, por exemplo, dentro do contrato de compra e venda.
     2.2. Comprovação do contrato: Certamente quem pagou arras, fica com uma prova documental. Ex.: Fui no banco e fiz uma TED, ou passei um cheque, paguei em dinheiro, me deram um recibo. Surge uma prova documental, mesmo que os contratos possam ser verbais, podem ter prova documental. É qualquer transferência de riquezas, dificilmente o juiz vai achar que é uma doação, e sim ele vai achar que há uma causa, que é o arras e há um contrato por trás disso!
     2.3. Princípio de pagamento: Arras valem como início, como princípio de pagamento. Se loquei o imóvel em Torres por 10 mil e ofereci agora mil reais para o vendedor, vou ter que pagar somente 9 mil quando chegar lá. É diferente de uma caução, eu ofereço em garantia os livros que mais gosto, se eu não cumprir o contrato, dou os livros, é uma garantia. O arras vai além de uma garantia, é um princípio de pagamento, já usa para satisfação do pagamento dela, o arras, já comecei o pagamento, mas não finalizei.
     2.4. Viabilizar o arrependimento: Eventualmente, as partes podem estipular o direito de arrependimento. Regra geral: Ninguém tem direito a se arrepender. Se todos celebrássemos um contrato, pensássemos por 1 semana e quiséssemos cancelar o contrato, como, por exemplo, comprar hoje um livro e na semana que vem devolvê-lo, haveria uma insegurança jurídica. Exceção: Podem as partes, mediante cláusula expressa no contrato, que introduzam a cláusula de arrependimento, por exemplo, quero comprar uma casa em Porto Alegre por 1milão de reais, pago 30 mil de arras, na outra semana negociamos o parcelamento do que falta, mas quero que fique expresso que posso desistir do negócio, é uma cláusula de arrependimento, mas neste caso o vendedor terá uma indenização, ele fica com os 30 mil de arras. Os arras também podem ter como função (não necessariamente) viabilizar o arrependimento, por exemplo, se acho um imóvel por 900 mil, perderei os 30 mil, mas economizo 100 mil com o outro imóvel, então terei lucro de 70 mil.
     2.5. Facilitar a indenização: O processo judicial demora para ser finalizado, uma ação de indenização demora de 3 a 5 anos para ser finalizada, então não é imediato o recebimento da indenização. Se uma parte oferece arras, se a outra parte é inocente, o arras já fica com a parte lesada, é uma forma de receber imediatamente uma indenização pela quebra do contrato, é um início de indenização, facilita a vida do credor, que aguarda os 5 anos para receber o resto da indenização. Às vezes até elimina o processo, porque o credor já fica feliz somente com o arras.
3. Distinção com a cláusula penal: Arras e cláusula penal têm funções parecidas, mas também tem disfunções. Não é a mesma coisa e não tem problema algum o contrato ter tanto a cláusula penal, como as arras. Ter a cláusula penal e os arras depende do evento, por exemplo, vamos imaginar que comprei o contrato da Goldsztein Cyrela, alguém comprou um imóvel e tem que pagar todos os meses 4 mil reais, e há uma cláusula dizendo que caso essa pessoa atrase o pagamento da mensalidade, pagará multa de 2% em cada parcela, isso é uma cláusula penal, e pode ter outra cláusula dizendo que as partes, para comprovar a realização do negócio estipulam que a compradora pagará 30 mil reais de entrada a título de sinal (arras), daí a compradora não consegue cumprir o negócio por várias razões (por exemplo, perdeu o emprego, está muito doente no hospital, etc), arras vai ser a perda dos 30 mil da entrada. Pode ser que tenha uma outra cláusula penal que diga que caso a parte não cumpra com suas obrigações, pagará 10% do valor do contrato, lá pelas tantas, o valor das arras já é de 10%, daí não tem mais o que discutir, mas em geral os arras são mais baixos, e o arras é o mínimo que vou ter que complementar. Se for maior que a cláusula penal, provavelmente no RS o Tribunal vai dizer que vai reduzir as arras porque são abusivas, na cláusula penal compensatória, na moratória (que é 2%) não, mas é raro o arras ser maior que a cláusula penal.
     3.1. Espécies da Cláusula Penal: Porque coloco num contrato uma cláusula penal? 1º Função: Ou é para punir a mora, ou para combater a mora (reforçando o vínculo, tenho que pagar os 500 reais de condomínio até o dia 5, se eu não pagar, eu vou incidir numa multa moratória, multa pelo atraso, então vou tentar pagar no dia par ame livrar desta multa, no exemplo dos condomínios é no máximo 2%).
     3.2. Cláusula penal é teto da indenização: 2º Função: Cláusula penal compensatória – Caso haja o inadimplemento completo/definitivo/absoluto, a cláusula penal serve de antemão para fixar o volume da indenização. Ex.: Caso eu não entregue a casa para quem alugou, e eu assim frustre a contratação, o locatário terá uma indenização prefixada no valor de 5 mil reais. Então, a cláusula penal compensatória serve para pré-quantificar o valor do prejuízo, e no CC há a seguinte regra geral no art. 416, p.ú. que vai dizer que ainda que o dano ultrapasse o número da cláusula penal, nada pé devido além da cláusula penal, ainda que a indenização seja de 1 bilhão de dólares, se a cláusula penal era de 100 mil reais, o valor devido a título de indenização é de 100 mil reais, porque a cláusula penal serve para pré-quantificar o dano. Quando fixo uma cláusula penal, estou preocupado com o inadimplemento.
Art. 416. Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo.
Parágrafo único. Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor provar o prejuízo excedente.
     3.3. Arras é o mínimo de indenização:  Regra geral: Quero garantir que vai ter adimplemento, que este contrato está feito, quero mostrar que chegamos a um acordo e que há um contrato protegido a luz do direito. Então, fixo um valor de arras, como 30 mil reais, caso haja algum inadimplemento futuro, em tese, as arras não interferem no valor da indenização, porque o que diz o art. 419 é que os arras valem como mínimo de indenização. Se dei 500 reais de arras e cheguei em Florianópolis para passar uma semana no Ano Novo e a casa não estava disponível para uso, a indenização vai ser bem maior do que os 500 reais de arras, e a lei via me autorizar a buscar. Então, as arras, em geral ou é a indenização, ou é o mínimo de indenização, que inclusive já recebi.
Art. 419. A parte inocente pode pedir indenização suplementar, se provar maior prejuízo, valendo as arras como taxa mínima. Pode, também, a parte inocente exigir a execução do contrato, com as perdas e danos, valendo as arras como o mínimo da indenização.
4. Espécies de Arras:
     4.1. Confirmatórios (art. 417): A modalidade mais usada de arras e a que usualmente vai para o judiciário é essa. O sentido do art. 417 é confirmar o negócio. A função das arras que estou entregando, é para garantir o contrato, ou o comprador já abate o valor que resta pagar, ou devolve.
Art. 417. Se, por ocasião da conclusão do contrato, uma parte der à outra, a Título de arras, dinheiro ou outro bem móvel, deverão as arras, em caso de execução, ser restituídas ou computadas na prestação devida, se do mesmo gênero da principal.
     4.2. Penitenciais (art. 420): Quando as estipulo, estou me preocupando com o eventual arrependimento, a parte está se penitenciando do contrato celebrado no passado.
Art. 420. Se no contrato for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes, as arras ou sinal terão função unicamente indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em ambos os casos não haverá direito a indenização suplementar.
5. Necessidade de expressa previsão do direito de arrependimento (art. 420): Exceção são as arras penitenciais. Como funcionam: Primeiro é necessário que esteja expresso no contrato que elas foram incluídas para viabilizar direito de arrependimento, ele não se presume, se qualquer uma das partes afirmar que se esqueceu de colocar a cláusula neste sentido, não será presumida. A exceção é que elas vão servir como toda indenização que a parte inocente receberá. Não tem como entrar com ação de indenização contra uma das partes quando há a cláusula de arrependimento.
6. Efeitos do inadimplemento (art. 418): 1ª Regra: Em caso de inexecução contratual (execução defeituosa), inadimplemento absoluto, quem recebeu as arras tem direito por lei de ficar com as arras, mas se o inadimplemento for de quem recebeu as arras, tem que devolver as arras (devolução em dobro = pago as arras e paga o equivalente ao recebido). Regra geral: art. 475 – quando ocorre o inadimplemento de um contrato, surge ao credor uma alternativa, ou busco o comprimento do contrato, ou a resolução do contrato, há perdas e danos. Quando há inadimplemento o credor pode exigir do juiz que seja cumprido o contrato (ele me dá as chaves da casa) ou peço o efeito liberatório (vou buscar outra casa), em qualquer das hipóteses há perdas e danos, e a parte inocente pode pedir todo prejuízo que ela teve, não há o limite das arras, fico com as arras se as recebi e fico com o resto, quando os arras são confirmatórios, se for o penitenciário é o art. 420.
Art. 418. Se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra tê-lo por desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir sua devolução mais o equivalente, com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, juros e honorários de advogado.
     6.1. Inadimplemento de quem prestou arras
     6.2. Inadimplemento de quem recebeu arras
7. Súmula 412/STF: Ainda é aplicada pelo STJ, mas tem que ter cuidado com casos mais específicos. Ex.¹: Vendi um apartamento por 500 mil para alguém, que me pagou 50 mil de arras penitenciais, 3 meses depois ela disse que não queria mais, ok, perdeu os 50 mil para mim e não posso buscar mais nada, arras penitenciais. Ex.²: Compro um imóvel e financio com a construtora em 10 anos, pago 1 ano a construtora e por alguma razão não tenho mais receita e paro de pagar, a construtora demora 4 anos parar tirar do imóvel (despejo), a jurisprudência do STJ diz que se condeno o comprador a indenizar a construtora em apenas o valor do sinal, porque ele desistiu do negócio, ele vai ter morado 4 anos sem pagar aluguel, vai ter havido desvalorização do imóvel, pode surgir uma dívida condominial (que a responsabilidade é do proprietário do bem, que vai ser a construtora depois), pode ter dívidas de luz, água, etc, então pode ser injusto em alguns casos devolver apenas o sinal, então o STJ tem vários acórdãos que diz que nestes casos em que o uso gerou proveito para uma parte e prejuízo manifesto para outra, é natura que seja buscado o excedente no judiciário, mesmo porque o CC de 2002 é diferente do CC de 1916, atualmente se entende que arras é o mínimo de indenização, e sob a exegese do CC anterior, outros juízes entendiam que arras era o teto, porque não tinha ordem expressa dizendo que era taxa mínima. Então, cuidado com a Súmula 412/STF, ela pode ou não ser aplicada, dependendo se ela vai conduzir um resultado justo ou injusto, porque hoje quem julga é o STJ e o que se aplica é o CC de 2002.
* Os Tribunais que interessam é 1º o STJ e 2º o STF, a missão do STJ é dar a última palavra do direito civil, pode ser que o STF não concorde com o STJ, mas é muito raro, em 99% das vezes quem dá a última palavra sobre o direito civil é o STJ. O STF surge mais ou menos em 1890, o STJ surge mais ou menos em 1988, e até o surgimento do STJ, a competência para julgar as matérias que hoje são do STJ, era do STF, há muitos entendimentos do STF até a fundação do STJ que ainda há no Código nas súmulas, e o STJ começou a ver quais iriam aplicar e quais não, e há uma súmula do STF antiga que fala sobre arras.
STF Súmula nº 412
Compromisso de Compra e Venda com Cláusula de Arrependimento - Devolução do Sinal ou Restituição em Dobro - Indenização a Título de Perdas e Danos - Juros Moratórios e Encargos do Processo
    No compromisso de compra e venda com cláusula de arrependimento, a devolução do sinal, por quem o deu, ou a sua restituição em dobro, por quem o recebeu, exclui indenização maior a título de perdas e danos, salvo os juros moratórios e os encargos do processo.

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