quinta-feira, 25 de abril de 2013

Direito Civil IV (25/04/2013)



Revisão Contratual

Teoria da Imprevisão

-> A teoria da imprevisão foi uma teoria que teve prestígio no séc. passado no Brasil, mas hoje se encontra positivada de uma maneira diferente no código, então grande parte dos doutrinadores nem utiliza mais esta nomenclatura.
-> Princípio da Força Obrigatória dos Contratos – quando celebramos um contrato, em geral pressupomos um  meio ambiente para a época de cumprimento do contrato., ou seja, estou celebrando um contrato com a Tam para fornecer querosene imaginando que o preço da querosene oscilara entre 50 e 70 no mercado internacional. Vou locar uma casa em Santa Maria imaginando que vou trabalhar nesta cidade por um período razoável, ou seja, quando celebramos contrato, em geral, as partes fazem pressuposições. O que fazer quando este meio ambiente que a parte encontra não é o mesmo que ela idealizou, ou seja, firmei um contrato, imaginei que encontraria características A, B, C na política do Banco Central e essas condições não se confirmam, são alteradas, como deve ser cumprido este contrato? Para responder a isto, uma das primeiras teorias surgidas na história do direito é a Teoria da Cláusula Rebus Sic Stantibus.

I- Cláusulas Rebus Sic Stantibus (Doutrina e Práticas Medievais – Direito dos Alimentos):
- O direito deve se adaptar à nova conjuntura, ou seja, o direito não pode ficar estático, ele tem que se adaptar às novas realidades, então sempre que surgir uma alteração no ambiente externo a uma relação jurídica, a relação jurídica tem que se adaptar a este novo ambiente jurídico, para que o direito consiga se oxigenar, para que o direito permaneça justo. Esta Teoria da Rebus Sic Stantibus surgiu na Idade Média, por influência dos canonistas (juristas da época vinculados à igreja). Esta cláusula que determina que ao longo da vida de uma relação jurídica, ela tem que ser alterada para constantemente se adaptar às novas realidades, é aplicada no direito brasileiro? Sim, há 7340 acórdãos do TJ mencionam Cláusula Rebus Sic Stantibus!
- Direito aos Alimentos: Os alimentos devem ser fixados conforme um binômio: possibilidade do devedor de alimentos e a necessidade do credor. A lei não diz que os alimentos são fixados em 1/3 do salário do cidadão, até fixam este critério, mas não é tão rígido, pois quando há salários mais altos, pode ser outro percentual. Esta pensão alimentícia não é fixada pelo juiz com o objetivo de durar para sempre, então há regras perante o direito brasileiro, por exemplo, a pensão alimentícia, em tese, deveria durar até a maior idade, mas se admite que quando este maior demonstra que ainda está se capacitando, como fazendo uma faculdade, há a possibilidade de continuar esta pensão alimentícia até os 24 anos. Ela não vai ter o mesmo valor a vida inteira, porque se aplica a Cláusula Rebus Sic Stantibus, há pelo menos 3 ações relacionadas ao direito dos alimentos: Ação de Alimentos: é para o cidadão que não os recebe e imagina que tem direito, o que a lei fala é que os parentes devem alimentos uns aos outros. Surgiu um instituto novo no direito brasileiro, que se chama “alimentos gravídicos” (alimentos pedidos pela gestante para cuidar da gestação, não precisa aguardar o nascimento com vida, pois desde que foi concebido o filho já gera gastos às gestantes). O magistrado fixa alimentos num valor X, por exemplo, vamos imaginar que casal de namorados se separa durante a gestação, ela é diretora jurídica de uma empresa de telefonia, ele é gerente comercial das lojas Renner, ela recebe 20 mil reais e ele recebe 10 mil reais, ela é gestante e ingressa com ação de alimentos contra ele, o juiz iria conceder? Provavelmente o TJ julgaria procedente a ação, porque o ônus de formar aquela criança e contribuir com os gastos são de ambos os pais, vão arbitrar em uns 20% (quando é filho único colocam um valor maior), porque se entende que se a mãe não tem necessidade, o filho pode ter. Foi arbitrado em mil reais esta pensão, 2 cenários: 1. A mãe da criança é demitida da empresa no 8º mês de gestação, ou quando ela voltou da licença da maternidade, quando o bebê tinha 9 meses, ela foi dispensada da empresa, qual ação que ela entra na justiça? Ação revisional () para majorar os alimentos, que o objetivo pode ser majorar ou reduzir, mil reais era adequado no cenário anterior, no momento que desaparece os 20 mil reais, aquele valor tem que ser modificado, deve ser majorado, isso é absolutamente legal, o mesmo poderia ocorrer caso ele perdesse o emprego, então provavelmente ele também entraria com revisional para haver uma redução, então reduziriam provisoriamente por uns meses até ele se restabelecer. Ação de exoneração: o pai vai entrar quando o filho tiver 24 anos, se não tiver acordo. Estas 3 ações aplicam Cláusula Rebus Sic Stantibus, adapta-se a relação jurídica a alteração das circunstâncias. As coisas vão mudar, então a história do direito disse que se aplicarmos Cláusula Rebus Sic Stantibus em todas relações jurídicas, todas elas vão perder estabilidade, porque todas elas sofrem com o percurso do tempo, por exemplo, entramos na Puc com uma profissão X, ao longo dessas 5 anos, pode ficar estável, pode melhorar e pode piorar, mas se o juiz de direito dissesse que se neste mês um aluno conseguiu um estágio, ele vai aumentar a mensalidade, se no outro mês acabasse o contrato de estágio, voltaria ao valor que ele pagava antes, se fosse assim, haveria uma insegurança total nas relações jurídicas. Então, foi necessário criar teorias que limitassem o alcance da Rebus Sic Stantibus, como a Teoria da Imprevisão (muito utilizada até o séc. passado e bem presente na história do direito).
II- Teoria da Imprevisão – Francês: É uma criação da jurisprudência francesa. 2 acórdãos da França explicam a Teoria da Imprevisão, que é o acordão do canal de Craponne e o acordão da companhia de gás da Bordeaux. O canal de Craponne é um acordão de 1886: um proprietário se compromete a fornecer água para o vizinho, então tenho canal que irriga a propriedade vizinha, ele recebe valor mensal por isso, este contrato é celebrado 3 séc. antes, ou seja, no séc. 16, então surge um momento que o valor que o proprietário gastava para irrigar o terreno do vizinho não pagava nem o contrato de água com a Corsan, ele tinha muito prejuízo, então ingressa ação na justiça dizendo que é Rebus Sic Stantibus, que 3 séculos depois tem que ser alterado este valor, e o Tribunal disse “Não reviso o contrato, pacta sunt servanda, Princípio da Intangibilidade do Contrato. Se você queria reajustar seu contrato, era você que teria que colocar esta cláusula no contrato. Não pertence ao Tribunal o direito de revisar qualquer contrato, são as partes, no momento de sua celebração, que tem que idealizar as formas e condições nas quais o contrato vai ser alterado”. Esta decisão é conhecida na história do direito, porque simboliza uma injustiça, 3 séculos depois ele tinha que prestar conforme o mesmo preço. Mas tem um belo acordão sobre Intangibilidade do Contrato, Princípio do Pacta Sunt Servanda, obrigatoriedade do contrato, o papel das partes na confecção do contrato, etc. Vem na 1ª déc. de 1900 um 2º caso, que é o acordão da Companhia de Gás de Bordeaux: desvalorização monetária, nos contratos firmados pela companhia de gás de Bordeaux, de longa duração, chegou um momento que o que os consumidores pagavam, não cobria os gastos que ela tinha para fornecer gás, a Corte ficou com o problema, ou manda continuar com o mesmo preço, ou vai revisar o contrato, então este caso é o grande exemplo da Civil Law de possibilidade judicial de revisão dos contratos. O canal de Craponne diz que não se revisam contratos (Pacta Sunt Servanda) e 30 anos depois há o caso da companhia de gás de Bordeaux, que a Corte percebe que se não revisar o contrato, a companhia não terá mais como fornecer gás, e isto não é bom para a população, então revisaram o contrato, criando a Teoria da Imprevisão, que diz que quando surgirem alterações do contrato, o magistrado estaria autorizado a revisar um contrato quando surgirem fatos imprevisíveis, que as partes não teriam como imaginá-los. Seria diferente da Rebus Sic Stantibus, porque, por exemplo, uma pequena guerra na Europa, não era algo fora de cogitação, então não teria como revisar o contrato, porque eu tinha como imaginar que haveria uma guerra, este é o critério da Teoria da Imprevisão, o que é previsível o contratante responde pelo isco, o que é imprevisível, o judiciário revisa. Qual a crítica que se fez à Teoria da Imprevisão? Ela é demasiada subjetiva, quando 2 pessoas celebram um contrato pelo qual uma delas ficará 5 anos fazendo um intercâmbio na Suécia, como o juiz vai saber o que as 2 partes previram que poderia acontecer durante estes 5 anos, é difícil para o magistrado imaginar o que uma parte prevê quando faz um contrato, então a Teoria da Imprevisão (que foi muito aplicada no séc. passado no RS) sofre esta crítica, o que é previsível? É difícil de responder, a vida não é 100% previsível. No séc. 20 sugere a Teoria da Onerosidade Excessiva. 3 mil e poucos acórdãos da Teoria da Imprevisão.
III- A Onerosidade Excessiva (art. 478, CCB) - Italiano: O direito italiano tenta superar a Teoria da Imprevisão e oferece para esta Teoria da Onerosidade Excessiva. Em 1942 vem o Código Italiano (que vale até hoje) e traz uma figura chamada Resolução por Onerosidade Excessiva, é a figura que temos em nosso Código Civil a partir de 2002, entra em vigor 1 ano depois o art. 478 do CC, que introduz a figura da Onerosidade Excessiva para resolver as revisões de contrato no nosso direito. 221 acórdãos da Onerosidade Excessiva, ainda é pouco, mas vai aumentar nos próximos anos, porque ainda estamos raciocinando com o código anterior. Art. 478 – Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação. Na visão da jurisprudência e da doutrina, esta Teoria da Resolução por Onerosidade Excessiva apresenta 6 características no direito brasileiro:
1. Contrato de Execução Continuada ou Diferida: Vou aplicar somente em contratos de execução continuada ou diferida (não se aplica a contratos instantâneos). Continuada: contrato de aluguel, plano de saúde, mensalidade da Puc, etc. Diferida: vou assinar o contrato hoje para alguém me entregar as sacas de soja em 5 anos. Para contratos instantâneos há outros institutos, como o instituto da lesão (art. 157).
2. Consideração dos Riscos do Negócio: O magistrado tem que se ater aos riscos do negócio, não é a previsibilidade da parte. O juiz considera o negócio em si, sai o aspecto subjetivo da Teoria da Imprevisão, ele vai imaginar que riscos normais aquele negócio apresenta, por exemplo, quero acertar com alguém as 100 mil ações que ele da OZX tem em alguma empresa, vou pagar 2 reais por ação e em dezembro de 2014 a pessoa me passa as ações, se quem vendeu entrar com uma ação em 2 anos dizendo que naquele dia as ações estão valendo 4 reais, o juiz vai dizer que esta oscilação é da alma do negócio e se o juiz entender que o risco está dentro do negócio, ele não revisa o contrato. Se quero operar uma empresa aera no Brasil, está dentro dos cálculos lógicos o extravio de bagagem, roubo de bagagem, variação do preço da querosene, etc, são matérias de risco normal do negócio.
3. Acontecimentos Extraordinários e Imprevisíveis: O acontecimento deve ser extraordinário, ficou na lei o termo imprevisível, mas o que a doutrina e a jurisprudência mais valorizam, é a extraordinariedade. É previsível que a Argentina entre em guerra com as Malvinas? Um juiz brasileiro aplicaria a Teoria da Imprevisão, diria que este evento seria absolutamente extraordinário, como uma intensa neve que caísse em Porto Alegre e perturbasse o tráfego da Carris e das empresas aéreas, porque é muito raro ter neve em Porto Alegre. Tem que ser um evento que foge da normalidade, algo mais objetivo do que aquilo que a parte pode prever.
4. Prestação de uma Parte Excessivamente Onerosa: Esta extraordinariedade deve prever que uma prestação se torne excessivamente onerosa para uma das partes e terá prejuízo, e excessivamente vantajosa para outra, como comprar de uma fazenda o fornecimento de saladas na minha casa durante 1 ano, de uma hora para outra o governo federal aumenta o preço da couve, para mim fica vantajoso o contrato, e muito difícil de a outra parte cumprir, porque o preço da couve aumentou demais, os preços oscilam!
5. Efeito Legal: A Resolução: O efeito da lei é a quebra do contrato, é a resolução do contrato. O que há grande discussão na doutrina é que se a lei acertou, porque estas teorias surgiram não para quebrar contratos, mas sim para revisá-los, então a grande crítica que a doutrina brasileira faz é que este efeito legal está incorreto, o efeito legal deveria ser a revisão (é prevista na lei como subsidiária), e se não der certo, ai sim deveríamos ir para a resolução, então na visão da doutrina seria muito mais sistemática e coerente com a evolução das ideia do direito que em 1º lugar o juiz tentasse revisar, se não desse certo, em 2º lugar, eles quebram o contrato, parte do mecanismo mais suave para o mais radical, mas não é a posição do art. 478 do CC.
6. Efeito Subsidiário: A Revisão (art. 479, CCB): Regra Subsidiária. Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato. O art. 479 diz que quando o réu oferece alternativa equitativa conforme a justiça para harmonizar os interesses em jogo, ai sim teria espaço a revisão, porque se as partes estavam de acordo quanto aquela resolução contratual, elas simplesmente alteram e não vão para o judiciário, se vão para o judiciário é porque não deu acordo, talvez dê, mas será 10 ou 20% dos processos. Muitos juízes do Tribunal aplicam revisão e não resolução, porque têm base doutrinária para tanto.
IV- CDC, art. 6º, V: O CDC tem, na visão da doutrina, uma regra especial. Cláudia Lima Marques, Adalberto Pasqualoto e Bruno Miragem – 3 principais autores do Brasil no Direito do Consumidor. No CDC a regra é diferente, o art. 6º, V do CDC, a doutrina em geral considera que o regramento do CDC é pró-revisão dos contratos, no sentido de que o juiz tem mais simpatia para considerar os fatos externos a relação contratual, e quando ele reputa iniqua/injusta uma obrigação do consumidor, ele já teria base legal para entrar no conteúdo do contrato e resolver, é maior a liberdade do juiz no CDC. É mais fácil revisar no direito do consumidor, conforme o art. 6º, V, basta que eu demonstre o efetivo prejuízo do consumidor.
Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.

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