Revisão
Contratual
Teoria
da Imprevisão
-> A teoria da
imprevisão foi uma teoria que teve prestígio no séc. passado no Brasil, mas hoje
se encontra positivada de uma maneira diferente no código, então grande parte
dos doutrinadores nem utiliza mais esta nomenclatura.
-> Princípio da
Força Obrigatória dos Contratos – quando celebramos um contrato, em geral
pressupomos um meio ambiente para a
época de cumprimento do contrato., ou seja, estou celebrando um contrato com a
Tam para fornecer querosene imaginando que o preço da querosene oscilara entre
50 e 70 no mercado internacional. Vou locar uma casa em Santa Maria imaginando
que vou trabalhar nesta cidade por um período razoável, ou seja, quando
celebramos contrato, em geral, as partes fazem pressuposições. O que fazer
quando este meio ambiente que a parte encontra não é o mesmo que ela idealizou,
ou seja, firmei um contrato, imaginei que encontraria características A, B, C
na política do Banco Central e essas condições não se confirmam, são alteradas,
como deve ser cumprido este contrato? Para responder a isto, uma das primeiras teorias
surgidas na história do direito é a Teoria da Cláusula Rebus Sic Stantibus.
I- Cláusulas Rebus Sic Stantibus (Doutrina e Práticas
Medievais – Direito dos Alimentos):
- O direito
deve se adaptar à nova conjuntura, ou seja, o direito não pode ficar estático,
ele tem que se adaptar às novas realidades, então sempre que surgir uma
alteração no ambiente externo a uma relação jurídica, a relação jurídica tem
que se adaptar a este novo ambiente jurídico, para que o direito consiga se
oxigenar, para que o direito permaneça justo. Esta Teoria da Rebus Sic
Stantibus surgiu na Idade Média, por influência dos canonistas (juristas da época
vinculados à igreja). Esta cláusula que determina que ao longo da vida de uma
relação jurídica, ela tem que ser alterada para constantemente se adaptar às
novas realidades, é aplicada no direito brasileiro? Sim, há 7340 acórdãos do TJ
mencionam Cláusula Rebus Sic Stantibus!
- Direito aos Alimentos: Os alimentos devem ser fixados conforme um binômio:
possibilidade do devedor de alimentos e a necessidade do credor. A lei não diz que
os alimentos são fixados em 1/3 do salário do cidadão, até fixam este critério,
mas não é tão rígido, pois quando há salários mais altos, pode ser outro percentual.
Esta pensão alimentícia não é fixada pelo juiz com o objetivo de durar para
sempre, então há regras perante o direito brasileiro, por exemplo, a pensão alimentícia,
em tese, deveria durar até a maior idade, mas se admite que quando este maior
demonstra que ainda está se capacitando, como fazendo uma faculdade, há a
possibilidade de continuar esta pensão alimentícia até os 24 anos. Ela não vai
ter o mesmo valor a vida inteira, porque se aplica a Cláusula Rebus Sic Stantibus,
há pelo menos 3 ações relacionadas ao direito dos alimentos: 1º Ação de Alimentos: é para o cidadão
que não os recebe e imagina que tem direito, o que a lei fala é que os parentes
devem alimentos uns aos outros. Surgiu um instituto novo no direito brasileiro,
que se chama “alimentos gravídicos” (alimentos pedidos pela gestante para
cuidar da gestação, não precisa aguardar o nascimento com vida, pois desde que
foi concebido o filho já gera gastos às gestantes). O magistrado fixa alimentos
num valor X, por exemplo, vamos imaginar que casal de namorados se separa
durante a gestação, ela é diretora jurídica de uma empresa de telefonia, ele é
gerente comercial das lojas Renner, ela recebe 20 mil reais e ele recebe 10 mil
reais, ela é gestante e ingressa com ação de alimentos contra ele, o juiz iria
conceder? Provavelmente o TJ julgaria procedente a ação, porque o ônus de
formar aquela criança e contribuir com os gastos são de ambos os pais, vão
arbitrar em uns 20% (quando é filho único colocam um valor maior), porque se
entende que se a mãe não tem necessidade, o filho pode ter. Foi arbitrado em
mil reais esta pensão, 2 cenários: 1. A mãe da criança é demitida da empresa no
8º mês de gestação, ou quando ela voltou da licença da maternidade, quando o
bebê tinha 9 meses, ela foi dispensada da empresa, qual ação que ela entra na
justiça? Ação revisional (2º) para
majorar os alimentos, que o objetivo pode ser majorar ou reduzir, mil reais era
adequado no cenário anterior, no momento que desaparece os 20 mil reais, aquele
valor tem que ser modificado, deve ser majorado, isso é absolutamente legal, o
mesmo poderia ocorrer caso ele perdesse o emprego, então provavelmente ele também
entraria com revisional para haver uma redução, então reduziriam
provisoriamente por uns meses até ele se restabelecer. 3º Ação de exoneração: o pai vai entrar quando o filho tiver 24
anos, se não tiver acordo. Estas 3 ações aplicam Cláusula Rebus Sic Stantibus,
adapta-se a relação jurídica a alteração das circunstâncias. As coisas vão
mudar, então a história do direito disse que se aplicarmos Cláusula Rebus Sic Stantibus
em todas relações jurídicas, todas elas vão perder estabilidade, porque todas
elas sofrem com o percurso do tempo, por exemplo, entramos na Puc com uma profissão
X, ao longo dessas 5 anos, pode ficar estável, pode melhorar e pode piorar, mas
se o juiz de direito dissesse que se neste mês um aluno conseguiu um estágio,
ele vai aumentar a mensalidade, se no outro mês acabasse o contrato de estágio,
voltaria ao valor que ele pagava antes, se fosse assim, haveria uma insegurança
total nas relações jurídicas. Então, foi necessário criar teorias que
limitassem o alcance da Rebus Sic Stantibus, como a Teoria da Imprevisão (muito
utilizada até o séc. passado e bem presente na história do direito).
II- Teoria da Imprevisão – Francês: É uma criação da jurisprudência francesa. 2 acórdãos
da França explicam a Teoria da Imprevisão, que é o acordão do canal de Craponne
e o acordão da companhia de gás da Bordeaux. O canal de Craponne é um acordão
de 1886: um proprietário se compromete a fornecer água para o vizinho, então
tenho canal que irriga a propriedade vizinha, ele recebe valor mensal por isso,
este contrato é celebrado 3 séc. antes, ou seja, no séc. 16, então surge um
momento que o valor que o proprietário gastava para irrigar o terreno do
vizinho não pagava nem o contrato de água com a Corsan, ele tinha muito prejuízo,
então ingressa ação na justiça dizendo que é Rebus Sic Stantibus, que 3 séculos
depois tem que ser alterado este valor, e o Tribunal disse “Não reviso o
contrato, pacta sunt servanda, Princípio da Intangibilidade do Contrato. Se
você queria reajustar seu contrato, era você que teria que colocar esta
cláusula no contrato. Não pertence ao Tribunal o direito de revisar qualquer
contrato, são as partes, no momento de sua celebração, que tem que idealizar as
formas e condições nas quais o contrato vai ser alterado”. Esta decisão é
conhecida na história do direito, porque simboliza uma injustiça, 3 séculos depois
ele tinha que prestar conforme o mesmo preço. Mas tem um belo acordão sobre Intangibilidade
do Contrato, Princípio do Pacta Sunt Servanda, obrigatoriedade do contrato, o
papel das partes na confecção do contrato, etc. Vem na 1ª déc. de 1900 um 2º
caso, que é o acordão da Companhia de Gás de Bordeaux: desvalorização
monetária, nos contratos firmados pela companhia de gás de Bordeaux, de longa
duração, chegou um momento que o que os consumidores pagavam, não cobria os
gastos que ela tinha para fornecer gás, a Corte ficou com o problema, ou manda
continuar com o mesmo preço, ou vai revisar o contrato, então este caso é o
grande exemplo da Civil Law de possibilidade judicial de revisão dos contratos.
O canal de Craponne diz que não se revisam contratos (Pacta Sunt Servanda) e 30
anos depois há o caso da companhia de gás de Bordeaux, que a Corte percebe que
se não revisar o contrato, a companhia não terá mais como fornecer gás, e isto
não é bom para a população, então revisaram o contrato, criando a Teoria da Imprevisão,
que diz que quando surgirem alterações do contrato, o magistrado estaria autorizado
a revisar um contrato quando surgirem fatos imprevisíveis, que as partes não
teriam como imaginá-los. Seria diferente da Rebus Sic Stantibus, porque, por
exemplo, uma pequena guerra na Europa, não era algo fora de cogitação, então
não teria como revisar o contrato, porque eu tinha como imaginar que haveria
uma guerra, este é o critério da Teoria da Imprevisão, o que é previsível o
contratante responde pelo isco, o que é imprevisível, o judiciário revisa. Qual
a crítica que se fez à Teoria da Imprevisão? Ela é demasiada subjetiva, quando
2 pessoas celebram um contrato pelo qual uma delas ficará 5 anos fazendo um
intercâmbio na Suécia, como o juiz vai saber o que as 2 partes previram que
poderia acontecer durante estes 5 anos, é difícil para o magistrado imaginar o
que uma parte prevê quando faz um contrato, então a Teoria da Imprevisão (que
foi muito aplicada no séc. passado no RS) sofre esta crítica, o que é
previsível? É difícil de responder, a vida não é 100% previsível. No séc. 20 sugere
a Teoria da Onerosidade Excessiva. 3 mil e poucos acórdãos da Teoria da Imprevisão.
III- A Onerosidade Excessiva (art.
478, CCB) - Italiano: O direito
italiano tenta superar a Teoria da Imprevisão e oferece para esta Teoria da
Onerosidade Excessiva. Em 1942 vem o Código Italiano (que vale até hoje) e traz
uma figura chamada Resolução por Onerosidade Excessiva, é a figura que temos em
nosso Código Civil a partir de 2002, entra em vigor 1 ano depois o art. 478 do
CC, que introduz a figura da Onerosidade Excessiva para resolver as revisões de
contrato no nosso direito. 221 acórdãos da Onerosidade Excessiva, ainda é
pouco, mas vai aumentar nos próximos anos, porque ainda estamos raciocinando
com o código anterior. Art. 478 – Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a
prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema
vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e
imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da
sentença que a decretar retroagirão à data da citação. Na visão da jurisprudência e da doutrina, esta Teoria
da Resolução por Onerosidade Excessiva apresenta 6 características no direito
brasileiro:
1. Contrato de Execução Continuada ou Diferida: Vou aplicar somente em contratos de
execução continuada ou diferida (não se aplica a contratos instantâneos).
Continuada: contrato de aluguel, plano de saúde, mensalidade da Puc, etc.
Diferida: vou assinar o contrato hoje para alguém me entregar as sacas de soja
em 5 anos. Para contratos instantâneos há outros institutos, como o instituto
da lesão (art. 157).
2. Consideração dos Riscos do Negócio: O magistrado tem que se ater aos riscos do negócio,
não é a previsibilidade da parte. O juiz considera o negócio em si, sai o
aspecto subjetivo da Teoria da Imprevisão, ele vai imaginar que riscos normais aquele
negócio apresenta, por exemplo, quero acertar com alguém as 100 mil ações que
ele da OZX tem em alguma empresa, vou pagar 2 reais por ação e em dezembro de
2014 a pessoa me passa as ações, se quem vendeu entrar com uma ação em 2 anos
dizendo que naquele dia as ações estão valendo 4 reais, o juiz vai dizer que
esta oscilação é da alma do negócio e se o juiz entender que o risco está dentro
do negócio, ele não revisa o contrato. Se quero operar uma empresa aera no
Brasil, está dentro dos cálculos lógicos o extravio de bagagem, roubo de
bagagem, variação do preço da querosene, etc, são matérias de risco normal do
negócio.
3. Acontecimentos Extraordinários e Imprevisíveis: O acontecimento deve ser extraordinário, ficou na
lei o termo imprevisível, mas o que a doutrina e a jurisprudência mais
valorizam, é a extraordinariedade. É previsível que a Argentina entre em guerra
com as Malvinas? Um juiz brasileiro aplicaria a Teoria da Imprevisão, diria que
este evento seria absolutamente extraordinário, como uma intensa neve que
caísse em Porto Alegre e perturbasse o tráfego da Carris e das empresas aéreas,
porque é muito raro ter neve em Porto Alegre. Tem que ser um evento que foge da
normalidade, algo mais objetivo do que aquilo que a parte pode prever.
4. Prestação de uma Parte Excessivamente Onerosa: Esta extraordinariedade deve prever que uma prestação
se torne excessivamente onerosa para uma das partes e terá prejuízo, e
excessivamente vantajosa para outra, como comprar de uma fazenda o fornecimento
de saladas na minha casa durante 1 ano, de uma hora para outra o governo
federal aumenta o preço da couve, para mim fica vantajoso o contrato, e muito
difícil de a outra parte cumprir, porque o preço da couve aumentou demais, os
preços oscilam!
5. Efeito Legal: A Resolução: O efeito da lei é a quebra do contrato, é a
resolução do contrato. O que há grande discussão na doutrina é que se a lei
acertou, porque estas teorias surgiram não para quebrar contratos, mas sim para
revisá-los, então a grande crítica que a doutrina brasileira faz é que este
efeito legal está incorreto, o efeito legal deveria ser a revisão (é prevista
na lei como subsidiária), e se não der certo, ai sim deveríamos ir para a
resolução, então na visão da doutrina seria muito mais sistemática e coerente com
a evolução das ideia do direito que em 1º lugar o juiz tentasse revisar, se não
desse certo, em 2º lugar, eles quebram o contrato, parte do mecanismo mais
suave para o mais radical, mas não é a posição do art. 478 do CC.
6. Efeito Subsidiário: A Revisão (art. 479, CCB): Regra Subsidiária. Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a
modificar equitativamente as condições do contrato. O art. 479 diz que quando o réu oferece alternativa equitativa conforme
a justiça para harmonizar os interesses em jogo, ai sim teria espaço a revisão,
porque se as partes estavam de acordo quanto aquela resolução contratual, elas simplesmente
alteram e não vão para o judiciário, se vão para o judiciário é porque não deu
acordo, talvez dê, mas será 10 ou 20% dos processos. Muitos juízes do Tribunal aplicam
revisão e não resolução, porque têm base doutrinária para tanto.
IV- CDC, art. 6º, V: O CDC tem, na visão da doutrina, uma regra especial. Cláudia Lima
Marques, Adalberto Pasqualoto e Bruno Miragem – 3 principais autores do Brasil
no Direito do Consumidor. No CDC a regra é diferente, o art. 6º, V do CDC, a
doutrina em geral considera que o regramento do CDC é pró-revisão dos contratos,
no sentido de que o juiz tem mais simpatia para considerar os fatos externos a
relação contratual, e quando ele reputa iniqua/injusta uma obrigação do
consumidor, ele já teria base legal para entrar no conteúdo do contrato e resolver,
é maior a liberdade do juiz no CDC. É mais fácil revisar no direito do
consumidor, conforme o art. 6º, V, basta que eu demonstre o efetivo prejuízo do
consumidor.
Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:
V -
a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações
desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem
excessivamente onerosas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário