segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Sociologia Jurídica (03/10/2011)

Anthony Giddens "As Condições do Welfare State"

Anthony Giddens deve ser lido com o complemento do texto de David Held “A Democracia e a Ordem Global” (em espanhol).
David Held é um texto clássico -> o surgimento do direito internacional após a paz do Westphalen e acaba socavando os limites da concepção de soberania e autonomia do Estado Moderno.

Antony Giddens busca explicar o processo de crise do Welfare State, partindo de 3 grandes contradições, a partir das fontes estruturais do Estado de Bem Estar Social.
1ª fonte estrutural do Welfare State: trabalho assalariado que corresponde ao processo de acumulação de capital. Um trabalho que se realiza na indústria, em jornada de tempo integral, e mais importante que isso é o assalariamento. Baseado nessa concepção de trabalho generalizado encontramos o surgimento de uma política de pleno emprego. O pleno emprego era entendido como um emprego para mão de obra masculina, o Estado Social pressupunha uma família patriarcal, o projeto do Welfare State condenava o homem à labuta e a mulher a domesticidade. Uma das marcas do Welfare State era haver uma renda mínima universal, que faria jus a todos os trabalhadores (desde o mais humilde até o mais poderoso empresário).
2ª fonte estrutural do Welfare State: diz respeito ao fato de o Welfare State sempre ter procurado desenvolver uma solidariedade nacional, e para entendê-la temos que pensar o Estado como Estado-nação, que nasce desde uma unificação das cidades-estados. O Estado-nação desenvolve uma crença da soberania nacional, ou seja, desenvolve a crença de que o Estado tem o direito de governar um determinado território. Nenhum território poderia ser colocado acima desse território. Se o Estado tem o direito de se autogovernar e é autônomo, pode também desenvolver uma solidariedade nacional, para fazer frente a possíveis ameaças. O desenvolvimento de uma defesa da solidariedade nacional é fundamental para compreendermos o Welfare State.
3ª fonte estrutural do Welfare State: diz respeito ao Welfare State sempre aparecer para os cidadãos como um seguro de vida. Diz respeito à administração de riscos, que está baseada na crença de que através da razão os riscos serão capazes de serem administrados cientificamente. Os riscos são riscos naturais, aos quais os indivíduos estão expostos, como a doenças, a velhice, etc. Se olharmos a história dos países capitalistas centrais (França e Alemanha), até o séc. XVIII não encontraremos nenhuma instituição previdenciária para tratar desses riscos, como a pobreza. Os pobres seriam os indivíduos que não estavam dispostos a trabalhar (deveriam ser castigados), ou os indivíduos que estavam incapacitados de trabalhar (precisavam de caridade, deveriam existir instituições), existiam os pobres bons e os pobres maus, e esses últimos seriam os com deficiência de caráter. Existia uma crença de que existiam indivíduos que não estavam expostos aos riscos, ou uma camada que possuía provisões (recursos próprios) para fazer frente a uma situação de provisoriedade de precariedade, ou seja, os indivíduos que têm dinheiro, e havia os indivíduos que não possuíam recursos próprios para fazer frente a uma situação de vulnerabilidade, de precariedade. Mas Anthony Giddens percebeu durante a Segunda Guerra Mundial que, por exemplo, as bombas V2 não escolheriam as casas que iriam cair, então perceberam que não eram somente os das classes subalternas que estavam expostos a riscos. Existe a crença de que os riscos podem ser administrados cientificamente.

A partir da década de 70 há uma economia calcada nos serviços altamente sofisticados, não está mais calcada na produção. Isso significa que essa nova economia, baseada nas inovações tecnológicas, está gerando empregos diferentes dos anteriores (quando a economia estava calcada na fábrica, na indústria), serviços tecnológicos sofisticados. Essa nova economia informacional tem preferência na utilização na mão de obra feminina.
Argumentos que procuram justificar essa preferência:
  A preferência pela utilização da mão de obra feminina não resulta da grande capacidade da mulher de sorrir, nem pelo fato de as mulheres não estarem acostumadas a beber demais.
  1º elemento estrutural: Esses empregos já não são de tempo integral, e sim de tempo parcial. Não temos mais aquela jornada de trabalho pendular, ou seja, as mulheres não deixariam de realizar as atividades tradicionais das mulheres (desde levar os filhos a escola, no médico, ou ir ao supermercado). Encontraremos uma primeira consequência da entrada das mulheres no mercado de trabalho, que foi quando todas as cidades passaram pela crise do sistema de transportes, que era pendular, ou seja, casa-fábrica ou casa-empresa, mas hoje há sistema de transportes que cruzam a cidade, por causa das novas atividades. Há uma transformação, o próprio desenvolvimento (processo de acumulação de capital) é que acaba corroendo, solapando esta fonte estrutural. A política de pleno emprego, proposta pelo Welfare State sempre foi para a mão de obra masculina, portanto, o ingresso massivo das mulheres no processo de trabalho enfraqueceu a 1ª fonte do Welfare State.
  2º elemento estrutural: Estamos frente a dois conceitos, de soberania (direito de todo e qualquer Estado de se autogovernar, estamos no plano dos direitos) e de autonomia (diz respeito à capacidade efetiva que um Estado tem de realizar projetos, sem necessitar de instituições colocadas acima do território nacional). Os exemplos de agora serão encontrados no texto de David Held. De 1648 (paz do Westphalen, que acaba com a Guerra dos 30 anos) até 1945 (ou 1948, na declaração universal dos direitos humanos), nesse tratado de paz do Westphalen se produziu um direito internacional, onde pela 1ª vez veremos o reconhecimento de uma concepção de soberania (de autodeterminação), o direito internacional do Westphalen perdura nesse tempo (1648-1948), e nesse período o direito internacional reconhecia como sujeito de direito os Estados, os indivíduos eram mais objetos, mas não eram sujeitos do direito, ou seja, ele excluía os indivíduos, não existiam provisões para tratar sobre o indivíduo. Se um indivíduo estivesse num outro Estado (por exemplo, um cidadão brasileiro fosse para os EUA) e cometesse uma ação que tivesse sido ordenada por um superior hierárquico, ou ação essa que derivasse de uma ordem expressa do Estado-nação (Brasil), não poderia ser colocado no banco de réus, e se colocado não poderia ser condenado sempre quando um indivíduo arguisse ter sido esse seu ato derivado do cumprimento expresso de uma ordem de um superior hierárquico ou no cumprimento de uma ordem expressa do direito no cargo estatal de seu país, o indivíduo não teria agido como pessoa física, e sim no cumprimento de uma ordem que era emitida pelo Estado-nação ou pelo cumprimento de uma ordem de um superior hierárquico. Esse direito internacional começa a ser questionado com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, porque ali vamos encontrar direito que são declarados como universais, ou seja, estão acima do Estado-nação. A partir desse momento, os indivíduos serão instigados a não obedecer, contrariar toda e qualquer ordem emitida pelo direito estatal, sempre quando essa ordem contrariar preceitos entendidos como direitos de valor universal, mesmo quando esse Estado não tenha participado de um acordo ou de um pacto.
  1948 – ao findar a Segunda Guerra Mundial encontraremos o Tribunal de Nuremberg e de Tóquio, e pela primeira vez encontraremos a criminalização e a condenação, dos indivíduos que tinham infringido através de suas ações pressupostos considerados de valor universal, os princípios humanitários não poderiam mais ser contrariados, mesmo a pessoa arguisse ter sido seu ato o cumprimento expresso de uma ordem de um superior hierárquico. Os indivíduos poderiam alegar uma subjeção de consciência para não realizar tal ato, iriam ser penalizados pela lei estatal, mas nesse caso os indivíduos poderiam (e podem até hoje) contar com uma série de procedimentos de valor universal, situados acima do Estado-nação, que irão estabelecer medidas de caráter coercitivo, para que ele (respeitando princípios universais) esteja contrariando e respeitando leis emitidas pelo seu Estado-nação.
  1966 - temos o pacto internacional de direito humanos, ali vamos encontrar uma situação que uma série de países vão ratificar o pacto. O Brasil vai assinar esse pacto em 1992, pois em 1966 o Brasil estava frente ao Regime Autoritário Militar, mas o fato de o Brasil não ter assinado o pacto não o isentava das responsabilidades do Tribunal Internacional.
  Há uma profunda modificação na esfera do direito, e logo após a Segunda Guerra Mundial, encontros, consenso de Washington, surgimento do fundo monetário internacional, uma instituição supra estatal e que passa agora a gerenciar a economia interna dos mais diferenciados países. Há uma série de instituições colocadas acima do Estado-nação, no caso da Europa tem o parlamento europeu. E essas instituições acabam solapando essa fonte estrutural do Welfare State (que era um Estado-nação).
  3º elemento estrutural: Os riscos que o Welfare State se propunha a administrar eram os chamados de riscos naturais, que todo e qualquer indivíduo está exposto pelo simples fato de estar vivo. Isso sempre foi muito mais crença, mas de qualquer maneira, o Estado Social não pode ser conhecido por um Estado Socialista, mas claro que esses partidos socialistas no poder na Europa de certa maneira produziram o Welfare State, mas não dá para afirmarmos que o Welfare State tenha sido a realização de um Projeto Socialista. “Os socialistas embalaram um filho que não era totalmente seu”, ou seja, querem dizer que os elementos que produziram o Welfare State são bem mais amplos do que a classe operária, mas claro que o Welfare State corresponde ao interesses da classe operária, mas o Welfare State também passou a ser demanda de camadas bem mais abrangentes do que a classe operária. O próprio empresariado (as camadas não operárias) desejava a construção de um Estado Social, porque a existência de um ES era a possibilidade de que uma situação de vulnerabilidade os indivíduos não ficarem carentes de recursos. O Welfare State não é a realização de um estado socialista, mas só com o socialismo que o Welfare State pôde se criar!
  O desenvolvimento científico tecnológico (que está na base do processo de transformação) alterou os riscos, que chamamos de riscos artificiais (que existem hoje), ou seja, são riscos produzidos pelo próprio desenvolvimento científico tecnológico e produzem efeitos que não poderiam ser previstos, e há uma quase impossibilidade de administrá-los! Há um marco antes e depois de Chernobyl (que recentemente aconteceu algo bem parecido no Japão)! O Welfare State entra em crise derivado das suas próprias contradições, não por uma crise de pauperismo (empobrecimento), mas pelo próprio processo de desenvolvimento científico tecnológico. O resultado disso é o reconhecimento da existência subclasses (under class), a existência de uma massa considerável de indivíduos que estão completamente fora do processo produtivo (camadas excluídas) e que passam por uma situação de privação, dando origem a uma série de contradições que nós vivenciamos no nosso dia a dia.

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