Intervenção do
Estado na Propriedade Privada
* Esse tema tem
como fundamento principal a ideia da supremacia do interesse público sobre o interesse
privado, esse princípio é a base do direito administrativo. Esse princípio
justifica uma série de coisas, entre elas está essa intervenção do Estado na
propriedade privada, que se dá com base no devido processo legal, é a ideia de
que para a administração agir ela tem que respeitar determinado procedimento,
não é uma medida arbitrária. Trata-se de uma garantia constitucional. Grande
parte dessas intervenções tem discricionariedade, mas ela decorre da lei, a lei
dá ao legislador limites.
- Conceito: “Entende-se por intervenção
na propriedade privada todo ato do
Poder Público que, fundado em lei, compulsoriamente retira ou restringe
direitos privados ou sujeita o uso de bens particulares a uma destinação de
interesse público.” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito
Administrativo Brasileiro 37. Ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 649) – A ideia é que o Estado pode (em determinados casos deve)
agir/impor limitações sempre em prol do interesse público, não é uma medida que
vai beneficiar diretamente o Estado. Recai sobre bens particulares, e vai fazer
com que eles tenham sua utilização de alguma forma restringida. Essas
intervenções sempre são fundadas em lei. Em vários casos há procedimentos
específicos que tem que ser seguidos. A ideia é que a propriedade hoje é
diferente da propriedade concebida no Código Napoleônico, onde ainda se previa
uma propriedade fundada no Direito Romano, em que o proprietário tinha o
direito de usar, fruir e dispor, a ideia que se tinha é que a propriedade nas
mãos do proprietário poderia ser usada como ele quisesse. Mas na prática nem em
Roma isso aconteceu.
- Fundamento:
* Função Social da
Propriedade: “A referência
constitucional à função social como
elemento estrutural da definição do direito à propriedade privada e da
limitação legal de seu conteúdo demonstra a substituição de uma concepção
abstrata de âmbito meramente subjetivo de livre domínio e disposição da
propriedade por uma concepção social de propriedade privada, reforçada pela
existência de um conjunto de obrigações para com os interesses da coletividade,
visando também à finalidade ou utilidade social que cada categoria de bens
objeto de domínio deve cumprir.” (MORAES, Alexandre. Direitos Humanos Fundamentais. 3. Ed. São Paulo: Atlas, 2000, p.
173) – A ideia é que o proprietário
acaba tendo além de direitos, obrigações. Hoje todos vivem inseridos dentro de
uma comunidade, então a propriedade que exercemos deve levar em conta essa
coletividade, o exercício do meu direito de propriedade pode trazer
complicações para um sujeito que não tem nada a ver com a história. Então a função
social da propriedade é reconhecer que essa propriedade está inserida dentro de
um contexto social. Se um sujeito tem uma grande área urbana e não faz nada com
ela, nada impede que o poder público possa impor um ônus maior, como aplicar um
imposto maior, ou até mesmo pode aplicar a desapropriação, com justificativa. A
questão da função social cria obrigações, e essas obrigações são suportar a
intervenção do poder público, ele pode impedir que o particular faça alguma
coisa, pode mandar que ele faça ou em último caso pode fazer com que o
proprietário perca a propriedade em função de não cumprir algumas coisas.
- Modalidades: são
restrições que de alguma forma vão incidir sobre a propriedade privada, mas a
única em que há leva a perda da propriedade é a desapropriação.
* Limitações
Administrativas: são
limitações impostas por ato administrativo genérico, não destinado a
propriedades determinadas, com o objetivo de atender ao interesse público por
meio de obrigação de não fazer. Atingem o caráter absoluto do direito de
propriedade. Como regra, não geram o deve de indenizar. Pode ser citado como
exemplo de limitação administrativa a limitação da altura de prédios. – Se trata de ato administrativo genérico, é um ato que vai
alcançar toda a coletividade, é diferente de uma restrição direta. Não vou
identificar quem vai ser o usuário dessas regras, é toda a coletividade, não
diz respeito a A, B, C ou D. O fato de estabelecer um limitador (X metros,
tantos quilômetros, determinada área de preservação) não afeta a generalidade e
a abstração desse ato administrativo. O objetivo vai ser sempre atender ao
interesse público. Se trabalha com uma obrigação de não fazer, não estou exigindo
que o particular faça algo, e sim estabeleço um limitador para ele não faça tal
coisa. O sujeito que sofre essa limitação, em princípio não tem o direito de
ser indenizado, a administração não precisa indenizar. Outros exemplos são o
recuo da calçada, a proximidade entre um prédio e outro, etc. Em geral elas são
reguladas no âmbito municipal, mas ainda podem ter regras de natureza
geral/nacional. Isso vai variar de área para área, de cidade para cidade, e
sempre de acordo com o interesse público.
* Ocupação Temporária: é o aproveitamento da propriedade privada para
utilização temporária pelo Poder Público para a execução de obras, serviços ou
atividades públicas de interesse público (art. 5º, XXV, da Constituição
Federal). A ocupação temporária pode ser remunerada ou não. – Aqui temos um instituto que implica na utilização por um
determinado tempo de um bem privado pelo poder público. Essa ocupação
temporária não implica na perda da propriedade, e sim implica numa restrição
que faz com que essa propriedade fique sendo utilizada pelo poder público
durante um determinado período, em determinadas situações, como estar colocando
gás subterrâneo, ou mesmo colocar tubulação para o escoamento do esgoto
fluvial, cloacal, essas obras podem provocar certo desconforto aos proprietários
vizinhos e implica que o poder público pode entrar na propriedade privada. Pode
implicar em remuneração ou não, vai depender do caso, no caso das oras de
alcance da coletividade não implica necessariamente em remuneração, mas se
eventualmente o poder público causar algum dano, esse dano gera ao particular o
direito à indenização, como alguém entrar na minha casa, fazer um buraco no
pátio e isso afetou a estrutura da casa ou estragou o muro, o particular tem
direitos à indenização. Essa ocupação temporária não tem um tempo máximo, mas
se sabe que ela é passageira.
* Tombamento: Definição: é a declaração editada pelo Poder Público acerca do
valor histórico, artístico, paisagístico, arqueológico, turístico, cultural ou
científico de um bem móvel ou imóvel, com o objetivo de preservá-lo. – O
tombamento pode ser de ofício, voluntário ou compulsório (o mais comum). Esse
tombamento é uma declaração editada pelo poder público que pressupõe uma medida
administrativa prévia que envolva o reconhecimento do valor desse bem. Temos o patrimônio
histórico, artístico, paisagístico, arqueológico, turístico, cultural e científico
municipal, estadual e federal, há a concorrência desses 3 entes para dispor
sobre esses assuntos. A ideia é estabelecer uma restrição a esse bem (pode ser
móvel ou imóvel) passe a ter um tratamento diferenciado, por exemplo, se tenho
um imóvel, como uma casa e ela é tombada pelo tombamento público, eu não posso
simplesmente reformar esse bem, mexer da maneira que eu achar melhor, até
porque dependendo do bem não vai ser nem reforma, e sim vai ser uma obra de
restauração. Começamos a nos preocupar com o patrimônio histórico recentemente,
até a constituição de 88 não havia uma preocupação mais efetiva. O tombamento
vai recair sobre bens móveis ou imóveis, mas é bem mais comum sobre bens
imóveis. Um bem móvel seria um objeto que foi utilizado por alguém importante
ou algo do tipo. O objetivo é a preservação do bem. A posse e a propriedade continuam
intocáveis, só se estabelecem restrições na restauração do bem, porque a ideia
é preservar esse bem tal qual ele foi originalmente produzido, mas o proprietário
continua sendo o particular. Inclusive esse bem pode ser vendido, alienado, mas
quem compra sabe que está adquirindo um bem tombado. O poder público tem
preferência na compra dos bens tombados quando o particular quer vende-lo, mas
se o poder público quer pagar menos que o particular oferece, ele não precisa
necessariamente vender para o poder público. O bem tombado é um bem de difícil
circulação no mercado. Em geral é difícil uma pessoa querer comprar um bem que
já tem restrições, por isso que o poder público acaba comprando e transformando
em museu ou algo do tipo. Não há nenhuma questão no comprador, pode ser
estrangeiro, etc, a questão é que tem que preserva-lo. A restauração é um
trabalho extremamente técnico. O tombamento pode
ser:
- De ofício (incidente sobre bens
públicos);
- Voluntário (incidente sobre bens
particulares com a concordância de seus proprietários); - Quando o próprio proprietário solicita ou concorda expressamente
com a incidência desse tombamento.
- Compulsório (incidente sobre bens
particulares e imposto coativamente, depois de regular procedimento
administrativo). – Mais comum! Se estabelece uma
série de atos, esses atos são encadeados e chagavam a determinada conclusão que
esse bem precisa de uma proteção especial. As reformas precisam de autorização
do poder público, não posso simplesmente contratar um pedreiro, ou colocar uma
tinta qualquer, preciso da autorização do poder público, que através da análise
de peritos vão verificar que tipo de mexida vai ser feita nesse bem. Se o
sujeito não tem condições para fazer uma restauração (que é mais cara que uma
reforma) poderá o sujeito requerer ao poder público que faça essa restauração,
mesmo sendo um bem particular.
* Requisição
Administrativa: é a utilização coativa de bens particulares em situações
emergenciais. A requisição pode ser de cunho civil, para evitar danos à coletividade, ou militar, realizada por autoridades militares para a manutenção da
segurança nacional (art. 5º, XXV, da Constituição Federal). – Implica na
utilização coativa bens particulares em situações emergenciais, não é uma situação
de normalidade. É por exemplo, para remover um doente que está em risco de vida,
então alguém pega um veículo para fazer isso, ou numa situação de guerra
requisitar armas, ou invadir um terreno de particular, etc. Vai ocorrer em situações
emergenciais e implica no ressarcimento ao particular de eventuais danos causados,
ou seja, o poder público ele deve indeniza-lo, é a ideia de que o Estado é responsável
pelos seus atos mesmo quando pratica atos lícitos. Como envolve situações
emergenciais, também é temporária. Não há a perda da propriedade, mas há a
perda da posse momentaneamente. Uma coisa é o domínio da propriedade, outra
coisa é a posse, posso ter a posse de coisas que não são de minha propriedade.
* Servidão
Administrativa: é
um ônus imposto pela Administração Pública a um imóvel particular. Ela não
transfere o domínio ou a posse do bem, mas limita o direito de uso e fruição. – A ideia da servidão é que é um direito real que estabelece uma ligação
entre diferentes bens, um vai ficar subordinado a outro. Vou estabelecer uma
limitação ao uso de determinado bem por força da existência de outro bem. No
direito privado há a servidão de passagem, que é quando há um terreno que por
alguma razão não tem saída para a via pública (é mais comum do que imaginamos),
nesse caso, para o sujeito ter a passagem, deve se estabelecer uma servidão de
passagem, um dos proprietários ao lado deve doar uma parte de seu terreno para
que o outro possa passar, pois ele tem esse direito, então se cria uma
restrição ao proprietário que doou uma parte de seu terreno. Tenho um bem que
ficará subordinado ao outro. No caso da servidão administrativa não é a mesma
regra do direito privado, mas se aproximam em algumas questões importantes. Temos
3 direitos decorrentes da propriedade, que é o direito de dispor, usar e fruir.
Com relação ao direito de dispor, a servidão administrativa não traz qualquer
problema, significa que o proprietário pode vender esse bem sempre que quiser,
da forma que quiser, mas a servidão vai acompanhar esse bem, um direito real
público. O sujeito não vai poder obter os frutos desse bem, o direito de usar o
bem vai ficar restrito à servidão, o direito de fruir é obter os frutos que
esse bem pode gerar. No que diz respeito ao uso e a fruição, o poder público
impõe limites, mas na disposição o único ônus será o fato de que o particular
que comprar o bem, a servidão vai junto. Ex.: rede elétrica sobrepondo-se sobre
determinada área (postes colocados dentro da própria propriedade), quando tem
placa com nome de rua diretamente na parede da casa também é uma espécie de
servidão administrativa, ou a questão de tubulação, cabos subterrâneos.
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